Rosalind Goforth - EU SEI QUE DEUS RESPONDE ÀS ORAÇÕES

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EU SEI QUE DEUS RESPONDE AS ORAÇÕES

EU SEI QUE DEUS RESPONDE ÀS ORAÇÕES TESTEMUNHO PESSOAL DE UMA VIDA

Rosaliná Goforth Trad.

Hope Gordon Silva

4a. Edição - 1983

LIVRARIA CRISTÃ UNIDA Caixa Postal, 1013 13.100 — Campinas, SP

Original inglês: How I Know Ood Answers Prayer Direitos Autorais: Mrs. Mary Goforth Moynan

HISTÓRICO

DA

CAPA

N o livro “ Goforth of China” no capítulo intitulado “ Evan­ gelho Nômade” , Rosalind Goforth assim descreve sua experiência de uma viagem evangelistica: “ Em 1917, Mr. Goforth licenciou-se de seu campo em Changte, na Província de Honan, a fim de cuidar do Trabalho de Reavivamento para o qual tinha sido chamado. Seu futuro havia de ser uma vida nômade. Nos dois anos que se seguiram, fazia-se necessário uma adaptação a cada mudança de pouso, e parece-nos que nos mudavamos a cada cinco dias!” “ A viagem ao sul da China parecia não ter fim. De W uchow a Kweilin, subindo o rio em direção ao oeste, via­ jamos num barco. E como era pequeno 1 (V er a capa). D o nosso único assento, uma tábua, podia eu usar meu fogão a querosene e cozinhar o que havia para ser cozido; pôr a mesa (u’a mala sóbre a tábua), e apanhar água do rio. Tudo isso sem sair do lugar” . “ Havia realmente um desconforto — o balanço violento do barco, passando por sobre trezentos e cincoentas vagas. Nós nos esquecêramos de trazer velas ou lamparinas, sendo forçados a ficar no escuro, sentados na tábua dura ou ir para a cama de tábuas às seis e meia, Iodas as noites. ' Não é de admirar que Jonathan dissesse: “Eu não iria recomendar esta viagem de repouso para ninguém !” “ Mas, que panorama! Era maravilhoso e indescritível. A um lado, as montanhas róseas, e em todo o trajeto, à medida que olhávamos para a frente, era como se passássemos um vale após outro” . Jonathan e Rosalind fizeram juntos essa vida por mais de vinte anos. Sua história é contada nos livros: “ Goforth of China” , sendo este, a biografia de Rosalind Goforth. A capa da presente edição, mostrando o casal de missionários, descendo o rio numa sampana, é de autoria de Mirianr Fretz.

A PRESEN TAÇÃO Minha mais recente lembrança do livro “ EU SEI QUE DEUS RESPONDE AS ORAÇÕES” , escrito por minha mãe, refere-se ao tempo em que eu era uma moça de dezoito anos, pronta a deixar a China, onde havia sido criada. Sou a décima, dos onze filhos de Jonathan e Rosalind Goforth. Foram missionários pioneiros em Honan, na China Central, servindo na missão da Igreja Presbiteriana Canadense. Lembro-me de quando disse a uma senhora muito sofisticada, que fora minha ama: “ Que tal? Minha mãe escreveu um liv ro !” Um verdadeiro respeito transpare­ cia em minha voz, e fiquei triste ou ou v ir: “ Oh, você provavelmente está querendo dizer que ela escreveu um pequeno folheto religioso” . Mas, Deus usa as pequenas e sintéticas coisas deste mundo para Seus próprios fins. Éste suave testemunho do poder de Deus foi primeira­ mente publicado em 1921 — e constantemente impresso. Desde então, através desses 40 anos, e espeeialmente através desses últimos 20, após a morte de minha mãe, tenho estado surpreendida e maravilhada com as ma­ nifestações inspiradoras com que Deus tem usado “ EU SEI QUE DEUS RESPONDE AS ORAÇÕES. Aqui estão alguns casos, que gravei mais claramente na me­ mória.

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Um professor de hebraico na Universidade Cana­ dense, disse-me certa.vez: “ Quando minhas dúvidas se acumulam, volto-me para o livro de sua mãe, em oração. E quando meus estudantes mostram uma fé duvidosa, empresto-lhes esse livro e sempre dá resultado!” Um jovem trabalhador em Pittsburgh, chamou-me um do­ mingo, tarde da noite, desculpando-se pela hora, e di­ zendo de sua necessidade em chamar-me para contar qúe tinha usado EU SEI QUE DEUS RESPONDE ÀS ORAÇÕES com seu grupo de jovens. Estávamos no capítulo que trata de “ evitar os boxeadores” , e nunca em minha vida estive tão certo da presença de Deus” . Repetidamente lembro-me de pais de adolescentes, que me contam de quão fascinados ficam com o livro, que sentem a necessidade de o ler até o fim . Uma carta de uma missionária amiga, em Cameroun, no Oeste da África, conta como uma outra senhora veio a ela num dia de profunda tribulação. Tinha aca­ bado de receber a notícia de que sua filha havia sido expulsa de um colégio nos Estados Unidos, por indisci­ plina. Minha amiga dirigiu-se à sua pequena biblioteca, pedindo, a Deus que a conduzisse ao livro adequado para aquela situação. Apanhou EU SEI QUE DEUS R E S­ PONDE ÃS ORAÇÕES, e as duas senhoras ficaram horas, lendo-o juntas, em voz alta. Depois disto a se­ nhora voltou à casa com nova paz no coração. Um proeminente líder da Igreja Presbiteriana nos Estados Unidos jantou em nossa casa, após ter pregado em nossa igreja, num domingo. Quando fomos apresen­ tados, disse ele: “ Oh, você é do clã dos G oforth! Meu

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primeiro interesse em missões, surgiu com o fato de uma tia mandar-me, quando ainda frequentava o colé­ gio recortes do “ Sunday School Times” , que apresenta­ vam a primeira publicação de “ EU SEI QUE DEUS RESPONDE AS ORAÇÕES” , escrito por sua mãe” . Aqui no Brasil, uma missionária canadense, minha amiga, conta como o livro lhe foi dado no dia anterior a uma operação muito séria. Leu-o noite afora e sen­ tiu-se inspirada a pedir que Deus a recuperasse em três dias — o fato parecia impossível — mas Ele respondeu, positivando uma grande bênção na Sua glória. Havíamos chegado há pouco em Campinas, quando encontrei uma missionária que, me olhando como a uma santa, assim se expressou: “ Há muitos anos atrás, li os livros de sua mãe ainda na China, e agora os estou lendo novamente. Há poucos dias disse a uma amiga brasileira: Como gostaria que esses livros fossem escri­ tos em português!” Um amigo episcopal esteve em minha casa uma noite, e emitiu um cheque de 40 libras, dizendo: “ Acabo de ler “ EU SEI QUE DEUS RESPONDE ÀS ORA­ ÇÕES” e soube que estão precisando de dinheiro para traduzi-lo em português. Eu quero investir essa quan­ tia no futuro do Brasil, tomando parte na tradução desse liv ro. ” É profunda a minha gratidão a Deus, por nova­ mente responder às orações, e tornar possível que minha

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mãe, embora morta, possa dar o seu testemunho numa língua, que nunca soube falar — a bela língua por­ tuguesa.

Mary Goforth Moynan

PREFÁCIO Por que eserevi este livrinho de testemunho pessoal às orações respondidas? Como pude escrever sobre acon­ tecimentos tão pessoais e sagrados de minha vida par­ ticular? — perguntam-me. Não poderia tê-lo escrito a não ser que me sentisse dirigida claramente por Deus. Foi o seguinte: Quando estava no Canadá por oca­ sião de nossa primeira licença, muitas vezes admiravame da incredulidade expressa diante da resposta à oração. Às vezes, via alguém dar de ombros, outras, percebia um silêncio repentino ou uma mudança brusca do assunto da conversa, e alguma vez ouvia a pergunta mais franca: “ Como a senhora sabe que isto não iria acontecer assim, de qualquer maneira?” Pouco a pouco, a impressão se cristalizava: Não creem em um, dois ou uma dúzia de testemunhos, será que não crerão no testemunho multiplicado de toda uma vida? Quanto mais pensava no que significaria relatar os incidentes, que nie eram sagrados com relação às minhas orações respondidas', mais queria eu fugir à publicidade e à tarefa que se me impunha. Havia dezenas de res­ postas muito íntimas para apresentar aos olhos do piíblico, algumas já conhecidas por poucas pessoas, outras.

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que só Deus conhecia. Mas, se o relato devia pesar para aqueles que não criam no elemento sobrenatural, que há na oração, muitos acontecimentos pessoais e não menos sagrados para mim, precisavam vir à luz. Repetidas vezes, pus de lado o assunto como sendo assaz impossível. Mas, sei agora que o plano era de Deus. À medida que os meses passavam e até os anos, constrangia-me o sentimento de que as respostas à oração precisavam ser escritas. No final da licença de 1908-10 — durante a qual nós, como família, recebemos bênçãos abundantes, que diante de nossa pequena fé só podíamos apreciar como maravilhosas respostas à oração — meu filho mais velho insistiu comigo para que eu relatasse em forma mais definitiva as respostas às orações de minha v id a ; e con­ seguiu que eu me comprometesse a fazer isto. Entretanto, depois que voltei à China, passaram-se meses sem que eu pusesse mãos à obra. Veio-me então uma doença grave e repentina, que ameaçava a própria vida; e o médico aconselhou-me a pôr em ordem meus negócios, sem demora. Eoi quando um senso de pesar profundo apoderouse de mim, porque não tinha registrado meu testemu­ nho de oração. Solenemente fiz um pacto com o Senhor : se Ele me levantasse, eu escrevería. Deixou de existir o problema sobre o que os outros iriam pensar; meu único desejo era obedecer. O Senhor pôs-me de pé. E embora fosse necessário Ele tratar

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ainda comigo severamente mais uma vez antes de eu começai’ realmente a escrever, finalmente iniciei — e os testemunhos aqui escritos, foram na maioria, em mo­ mentos esparsos durante árduas viagens missionárias entre os pagãos. Hão de compreender os leitbres que estes incidentes de orações respondidas não são apresentados, portanto, como mais dignos de admiração ou registro que inúme­ ros outros existentes no m undo; mas são escritos e pu­ blicados unicamente.porque ou eu os escrevia ou eu desobedecia a Deus. Rosalind Qoforth

ÍNDICE

“ Arranjando as coisas com Deus” ............................

13

Primeiras lições na vida de f é ....................................

17

“ Avançar de Joelhos”

........... ..................................

24

Um campo dado por Deus ......................................

35

Livramento da rebelião dos “ Boxers” ....................

48

A Prova da Fidelidade de Deus ............................

71

A história de umas férias ........................................

89

Nosso Deus, o Deus do impossível . ........................ 103 A o seu louvor! ............................................................ 119 A vitória encontrada ................................................. 125

“ ARRAN JANDO A S COISAS COM DEU S” Não se vendem cinco pardais por dois ases? Entretanto, nenhum deles está em esquecimento diante de D eus... Não temais! Bem mais valeis do que muitos pardais. Lucas 12:6,7. As páginas deste pequeno livro tratam sobretudo de um aspecto da oração — a petição. O relato é quase todo um testemunho do que tem significado para mim a súplica a meu Pai Celeste, nos embates diários de minha vida. Um eminente obreiro cristão, que leu alguns destes depoimentos no jornal evangélico The Sunday Times, disse-me: “ Dar ênfase a receber de Deus as coisas, con­ forme a senhora faz, é tornar a oração muito material” . Parece-me que a verdade é bem outra. Deus é meu Pai, eu sou Sua filha. Justamente como eu tenho alegria em que meu filho me procure quando ele está com frio, com fome, doente ou desamparado, assim é com meu Pai Celeste. A oração tem sido muito cerceada e restringida por regrinhas criadas pelo homem. Estou certa de que Deus quis que a oração fosse tão simples e natural, uma parte tão constante de no*ssa vida espiritual, como as comuhi-

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cações do convívio entre pais e filhos no lar. E assim como grande parte deste convívio consiste apenas em pedir e receber, assim é conosco e com nosso Pai do Céu. Entretanto, talvez o elemento mais importante deste pedir e receber de Deus esteja no reforço que traz à fé, uma resposta a uma oração definida. Pois, que é que pode ajudar a inspirar mais do que um testemunho vibrante do que Deus fêz? Recordando o passado, para escrever êstes inciden­ tes, uma das mais gratas lembranças é a de uma noite em que um grupo de amifeos se reunira em nossa casa. A conversa voltou-se às orações respondidas. Por mais de duas horas competimos uns com os outros ji o relato de experiências pessoais da operação maravilhosa de Deus; e permanece ainda hoje a inspiração daquela noite. Um ministro cristão disse-me certo dia: “ Será pos­ sível que o grande Deus do universo, o Criador e So­ berano da humanidade, se interesse, como a senhora quer dizer, por uma coisa tão insignificante como o en­ feite de um chapéu! Para mim, isto é um absurdo!” Contudo, foi o Senhor Jesus Cristo, quem disse: “ Até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados” ; e “ Nenhum pardal está em esquecimento diante de Deus” ; e ainda, “ O vosso Pai sabe o de que tendes ne­ cessidade, antes que Lho peçais” . É verdade que “ nada há que seja grande demais para o poder de Deus” ; e de igual modo é verdade que

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“ nada há que seja pequeno demais para o amor de D eus!” Se cremos na Palavra de Deus, precisamos crer, como disse Dan Crawford, bela e suscintamente: “ O Deus do infinito é o Deus do infinitésimo” . Sim. É Ele: Quem move o iceberg encalhado E o guia em seu caminho; Escuta o ruído do lemingue, E a voz do rapozinho! Talvez o maior testemunho de como Deus está pronto a socorrer em todas as emergências de uma vida, seja o seguinte, dado por Mary Slessor. Perguntaramlhe o que significava para ela, a oração. E escreveu ela: “ A minha vida é um longo registro dos dias e das horas em que Deus atendeu às minhas orações. Testifica-o a saúde física; o excesso de trabalho mental; a direção concedida tão maravilhosamente; os erros e perigos contornados; a inimizade ao Evangelho, vencida; o ali­ mento providenciado à hora exata em que era .necessá­ rio ; tudo o que constitui a vida e o meu humilde ser­ viço. Posso testificar, com admiração plena, e muitas ve'zes surprêsa, que eu creio que Deus' responde às orações. “ EU SEI QUE DEUS 'RESPONDE AS O R A Ç Õ E S!” Já me perguntaram: “ Deus sempre lhe deu aquilo que a senhora pedia?” Ah, não. Se Èle o tivesse feito, teria sido crueldade. Um exemplo: quando eu era môça, orei durante três anos para que Deus me concedesse um certo pedido. Ãs

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vezes eu orava como se fôra pela própria vida, tanto eu o desejei. Então Deus mostrou-me claramente que eu orava contra a Sua vontade. Submeti meu desejo ao Seu, neste assunto, e poucos meses depois Deus me deu o que era infinitamente melhor. Muitas vezes agradecí a Deus, Ele não me ter atendido, pois se tivesse me res­ pondido como eu desejava, nunca eu ter ia vindo à China. Também devemos lembrar-nos de que muitas ora­ ções nossas, embora ouvidas, não obtêm resposta por causa de algum pecado oculto na vida, ou por incredu­ lidade, ou por falta de preenchermos alguma outra exi­ gência bíblica, que governa a oração eficaz. O que segue não é um registro completo. Como po­ dería ser, se durante estes cinquenta anos não fiz uma lista das orações respondidas? Se o tivesse feito, não duvido que poderia ter escrito resmas de papel, ates­ tando em cada página a glória do poder de Deus em atender às orações. Mas, mesmo só com estas experiên­ cias -aqui anotadas, posso dizer também, EU SE I QUE DEUS RESPONDE ÀS ORAÇÕES. Deus respondeu à minha oração: Tão suavemente operou, Com bênçãos Ele me amou. Oremos, pois, pelo impossível. E aleancemos alto e bem visível A ousada e firme convicção: “ Meu Deus responde à oração” .

P R IM E IR A S LIÇÕES NA V ID A DE FÉ Amo ao Senhor, porque Ele ouve a minha voz e as minhas súplicas. Salmo 116:1. Quando eu era bem pequena, tão pequena que não me lembro de nada antes, sobreveio um forte temporal. Como trovejava! Aterrada, corri para minha mãe. Ela juntou minhas mãozinhas e apontando para cima repe­ tiu várias vezes uma única palavra: Jesus. Passaram-se mais de cinqüenta anos, mas a impres­ são deixada aquele dia em minha mente infantil, de um Ser invisível, porém, capaz de ouvir e ajudar, permane­ ceu indelével na memória. As mais preciosas lembranças da minha primeira infância são as que se associam às histórias, q\ie nossa mãe nos contava, muitas das quais ilustravam o poder da oração. Uma, que me deixou impressão profunda dizia res­ peito a meu avô, que ainda pequeno, foi visitar os primos no sul da Inglaterra. Moravam perto de n m a densa floresta. Certo dia, atraídas pelas belas flores silvestres, as crianças perderam-se completamente na mata. Depois de buscar em vão a saída, a mais velha, uma menina, chamou para junto de si os pequenos, que

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choravam assustados, e disse-lhes: “ Quando mamãe morreu ela nos pediu que sempre contássemos a Jesus, se nos encontrássemos em dificuldades. Yamos ajoelhar e pedir que Ele nos leve para casa. ” Ajoelharam-se, e enquanto ela orava, um dos pe­ quenos abriu os olhos, encontrando um passarinho tão perto de sua mão, que êle tentou pegá-lo. O pássaro saiu saltitando, mas sempre tão pertinho, que a criança foi levada a segui-lo. Logo todos tomaram parte, pro­ curando alcançar a avezinha, que ora voava, ora pula­ va à frente ou pouco acima deles, ora pousava no chão, onde quase a apanhavam. Dépois, de repente, alçou vôo de uma vez e foi-se embora. A s crianças ergueram os olhos e descobriram que estavam saindo da mata, à vista de casa. Tais foram as influências, que deixaram suas im­ pressões sòbre mim desde a mais tenra idade, e por isso não é de admirar que mesmo pequena, eu já soubesse “ contar a Jesus” as minhas dificuldades. Através das névoas da lembrança, um acontecimen­ to se destaca claramente, ocorrido quando eu tinha seis ou sete anos. TJm dia, estava eu brincando no jardim, e fui acometida de uma dor de dente, das que chama­ mos “ de pular” . Corri para mamãe em busca de alívio, mas parecia que nada que ela fazia, minorava a dor. Com certeza, o nervo estava exposto, pois a dor era aguda. De repente, pensei: “ Jesus pode ajudar-me” . E ali mesmo, com o rosto junto ao seio de minha mãe, eu disse de coração:

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— Senhor Jesus, se tirares de mim esta dor de dente agora, eu serei Tua menina por três anos. Antes de bem completar a oração, a dor desapare­ ceu completamente. Bu creio que foi Jesus, quem a tirou; e o resultado foi que durante anos, quando me sentia tentada a fazer qualquer arte, qualquer coisa errada, eu tinha mêdo de fazer o que sabia não estar direito, porque se eu não mantivesse minha parte no trato, segundo pensava, a dor de dente voltaria. Este pequeno incidente influenciou minha vida naquela época; deu-me um senso constante da realidade da pre­ sença de Deus, e assim ajudou-me, preparando-me para confessar públicamente a minha fé em Cristo, meu Sal­ vador, uns anos mais tarde, com a idade de onze anos. Cêrca de um ano depois de minha profissão de fé, deu-se um fato que confirmou minha convicção cristã, e levou-me a apreciar Deus como Pai com novos olhos. Quando chegou o domingo de Páscoa, amanheceu tão quente, que as roupas de verão eram as mais indi­ cadas. À hora do café, minha irmã e eu resolvemos que não iríamos a igreja, pois só possuíamos nossos velhos vestidos de inverno. Fui ao quarto e tomei a Bíblia para estudá-la. Bla abriu-se no capítulo 6 de Mateus, e meus olhos detiveram-se nestas palavras: “ E por que andais ansiosos quanto ao vestuário ? . . . Buscai, pois, em pri­ meiro lugar, o reino de Deus, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.” Poi por este tempo que nossa família recebeu uma prova inesquecível do cuidado e amor de Deus. Meus

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pais enfrentavam uma grave crise financeira. E Isaias 65:24 cumpriu-se literalmente: “ E será que antes que clamem, Eu responderei; estando éles ainda falan­ do, Eu os ou virei.” Ê preciso dizer que naquela época nós dependíamos de uma renda trimestral, que recebíamos por intermédio do advogado de minha mãe, na Inglaterra. Circunstân­ cias incomuns reduziram nossos recursos de tal manei­ ra que, nos achamos na metade do período com recursos, que escassamente dariam para uma semana. Mi­ nha boa mãe nos assegurava que Deus proveria; que Ele não abandonaria aqueles que nEle confiam. Pois, no mesmo dia, chegou uma carta do advogado in­ glês, anexando um cheque para uma quantia que daria amplamente para as nossas despesas até a data do pró­ ximo pagamento regular. O cheque inesperado e opor­ tuno foi Um abono, e nunca apareceu outro desta na­ tureza. Alguns anos depois, em outra cidade para onde nos mudamos, veio-me um grande desejo de realizar algum serviço definido para o Mestre. Certo dia, um apelo foi feito à classe de estudo bíblico, que eu freqüentava. Precisavam de professores para ajudar numa Escola Dominical vizinha. Quando me apresentei ao superin­ tendente e ofereci meus préstimos, era até natural que êle me recusasse, porque eu era nova e desconhecida. Disse-me que se quisesse uma classe, teria de arranjar meus próprios alunos. Ainda me lembro de como senti

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um nó na garganta durante todo o trajeto de volta para casa. Finalmente, com determinação e coragem inquebrantável, orei pedindo ao Senhor que me ajudasse a obter alunos. Saí, orando em cada passo do caminho, na tarde do sábado seguinte. Visitei as casas de uma pequena rua perto de nossa casa, e dezenove crianças prometeram ir à Escola Dominical. No outro dia, cheguei triunfante, um pouco orgulhosa do meu feito, com as dezessete crianças, que me seguiam. Não é preciso dizer que me deram uma classe. No outono de 1885 a União Missionária de Toronto, no Canadá, decidiu criar uma filial da missão nos cor­ tiços da Zona Leste daquela cidade. Três outras pessoas e eu fomos escaladas para o trabalho. Tudo o que dizia respeito era novidade para m im ; entretanto a experiên­ cia serviu-me de estímulo e inspiração. Em face de di­ ficuldades tremendas, que a meus olhos pareciam insu­ peráveis, aprendi que a oração era o segrêdo que tudo vencia, a chave que abria as portas cerradas. Sentia-me como criança que aprende uma lição nova e maravilhosa — pois bancos, mesas, cadeiras, fogão, combustível, lampiões, azeite e àté um órgão, tudo aparecia em resposta a orações definidas. Porém, mais importante, homens e mulheres, enlodados no pecado, agora se convertiam e se transformavam em pessoas, úteis à causa de Deus, por causa das orações em seu favor. Louvo a Deus pelas lições ali aprendidas, inesti­ máveis para quem mais tarde iria em outra terra, lidar com os pagãos.

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Chegou o dia em que dois caminhos divergentes se apresentavam diante de mim — um, conduzindo-me à Inglaterra como artista; o outro, à China como missio­ nária. As circunstâncias tornavam muito difícil a de­ cisão. Eu achava que já havia procurado todos os meios para descobrir a vontade de Deus no caso, mas a resposta não se tornava clara. Em certo dia angustiante, quando a vida de minha querida mãe parecia estar por um fio, eu me fechei num lugar com a Palavra de Deus, orando para que Ele me guiasse a uma passagem pela qual eu pudesse saber a vontade dEle para a minha vida. Minha Bíblia abriu-se em João 1 5 :16 e as palavras me falaram diretamente: “ Não fôstes vós que Me escolhestes a Mim; pelo con­ trário, Eu vos escolhi a vós outros, e vos designei para que vádes e deis frutos” . Fui procurar minha cara mãe e disse-lhe qual a mensagem que eu recebera de Deus. Ela respondeu-me: “ Não ouse lutar contra Deus” . Daquela hora em diante o último obstáculo, que im­ pedia minha ida à China foi removido. E certamente o modo extraordinário pelo qual Deus guardou esta Sua filha durante mais de trinta anos na China, prova que o chamado foi real. “ Reconhece-0 em todos os teus ca­ minhos, e Ele endireitará as tuas veredas” . (Prov. 3 :6), Durante o verão de 1887 chegou-me às mãos um livro escrito pelo D r. Hudson Taylor, China’s Spiritm l Needs and Claims (A s necessidades e Exigências Espirituais da China) é um livro em que o autor relata muitos exemplos da providência graciosa de Deus, em resposta à oração. Os fatos registrados impressionaram-

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me sobremodo. Pouco depois, algumas semanas antes de meu casamento, quando descobri que me faltavam cinqüenta dólares para eu me casar sem dívidas, resolvi não dizer nada a ninguém, porém confiar somente em Deus, para que Ele os mandasse. Ocorreu-me o pensa­ mento: se não posso confiar em Deus para tanto, quan­ do Hudson Taylor confiou que recebería muito mais do que isto, será que sou digna de ser missionária? Foi a primeira experiência que tive de esperar em Deus para receber dinheiro. Senti-me fortemente tentada a dar pelo menos uma indicação de minha necessidade a outras pessoas. Mas, nada disse. E embora passasse uma semana ou mais de dura provação, finalmente recebi paz interior e certeza de que Deus me atendería nesta emergência. A resposta, porém, só veio na véspera do casamento. Naquela noite, um grupo de colegas de trabalho da Missão da Zona Leste veio à casa e ofereceu-me um pre­ sente lindamente ornamentado, e também uma bôlsa. Depois que os amigos sairam, voltei à sala, onde estava reunida minha família. Mostrei o presente e a bôlsa fechada! Não me havia passado pela mente a idéia de que houvesse alguma coisa dentro da bôlsa, até que meu irmão disse: “ Tolinha, por que não a abre?” Abri a bôlsa, e descobri que continha um cheque no valor de cinqüenta dólares! O incidente sempre me foi singularmente precioso; pois, representava para nós o selo de Deus sobre a vida, que se descortinava à nossa frente.

i ri “ A V A N Ç A R DE JOELH OS” (1887-1894) Eu irei diante de ti, endireitarei os caminhos tortuosos, quebrarei as portas de bronze, despe­ daçarei as trancas de ferro. Isàías 45:2 Nesta tentativa de registrar o que significava a oração naqueles nossos dias pioneiros, é preciso dar testemunhos, que ultrapassam o domínio puramente pessoal; pois, éramos um pequeno grupo de missioná­ rios muito Unidos nas necessidades e nos perigos por que passamos. Em outubro de 1887, meu marido foi nomeado pela Igreja Presbiteriana do Canadá para abrir um novo campo no Norte da província de Honan, na China. Deixamos o Canadá em janeiro do ano seguin­ te, chegando à China em março de 1888. Só então per­ cebemos as dificuldades tremendas da tarefa, que es­ tava diante de nós. D r. Hudson Taylor, da Missão do Interior da China, escrevendo-nos na época, disse-nos o seguinte: “ Entendemos que o Norte de Honan será seu cam­ po de trabalho; faz dez anos que nós, como missão.

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procuramos entrar naquela província pelo Sul, e só agora pudemos fazê-lo. É uma das províncias mais anti-estrangeiras da China. . . Irmão, se quiser entrar nessa província, avance de joelhos” . Estas foram as palavras chaves para caracterizar aqueles primeiros anos de trabalho pioneiro. Quisera que um registro completo tivesse sido feito, da fideli­ dade de Deus em responder às orações! Nossas forças como missão e como indivíduos, durante aqueles anos perigosos e árduos, jaziam no fato de reconhecermos que sem auxílio divino a tarefa nos seria impossível. O seguinte fato ocorreu quando estávamos ainda fora dos limites de Honan, estudando a língua, em outra missão irmã. Ilustra como é importante a oração feita pelos cristãos da mãe-pátria por aqueles que estão no campo missionário. Meu esposo estava achando extremamente difícil a aprendizagem da língua. Dedicava muitas horas por dia ao estudo, mas o progresso era penoso e lento. Éle e seu colega sempre iam juntos à capela para se exercitarem na pregação em chinês; entretanto, em­ bora o Sr. Goforth tivesse vindo à China quase um ano antes do que o outro missionário, pediam os chi­ neses a este, que lhes falasse, ao invés do Sr. Goforth, dizendo que o entendiam melhor. Certo dia, à hora de sair para a capela como de costume, disse meu espók): “ Se o Senhor não me ajudar de modo muito especial com esta língua, tenho mêdo de fracassar como missionário.

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Poucas horas depois, voltou ele com o rosto ra­ diante de alegria. Disse-me ter percebido um auxílio extraordinário quando chegou sua vez de dirigir a pa­ lavra. As sentenças acudiram-lhe à mente como nunca antes; e não só ele se fizera entender, como conseguira comover alguns, que o procuraram ao término do culto para com ele conversar. Tanto esta experiência o ale­ grou e encorajou, que foi anotada cuidadosamente em seu diário. Uns dois meses e meio mais. tarde, veio uma carta de um aluno do Colégio Knox, contando que em certa noite alguns do estudantes haviam-se reunido especial­ mente para orar pelo Sr. Goforth. Tal foi o poder da oração, e tão manifesto o sentimento da presença de Deus que até resolveram escrever para perguntar ao Sr. Goforth, se recebera uma ajuda especial naquela hora. Recorrendo ao diário, verificou ele que o horá­ rio da reunião deles no Canadá correspondia exata­ mente àquela hora de maior desembaraço na língua. Não sei porque me vem ao pensamento O nome de alguém, que longe está — Distante no espaço e no tempo Precisa de minha oração, será? Estamos por demais preocupados E é tão fácil esquecer de alguém — Mas, Deus se lembra — e somos avisados A orar então, quando a lembrança vem. Talvez exista uma emergência, O amigo luta, falta-lhe poder, Enfrenta tenebrosa experiência — Eu oro. E Deus o pode atender!

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Finalmente chegou-nos a nós, senhoras que esperávamos fora de Honan, a grata notícia de terem nossos irmãos adquirido propriedades em dois centros. Seria difícil aos leitores compreender o que significa­ ram para nós aqueles anos de espera. Havia sempre o enorme perigo, que pairava sôbre nossos queridos en­ quanto viajavam em Honan. Por anos e anos, nunca eles saiam para fazer uma viagem, sem que nós não te­ méssemos a possibilidade de não voltarem. Mas o Senhor, em sua grande misericórdia, ouviu as orações que fa­ zíamos por eles; e embora passassem por grandes pe­ rigos, nenhum deles foi gravemente ferido. Este livro não é uma história da Missão, porém, não posso deixar de relatar um incidente, que ilustra como Deus guar­ dou naqueles primeiros tempos. Dois dos irmãos, depois de alugarem uma casa numa cidadezinha já dentro dos limites de Honan e perto do Rio Wei, para lá se mudaram, pretendendo passar o inverno. No entanto, sobreveio uma perse­ guição repentina e intensa, assim que se viram estabe­ lecidos ali. Homens amotinados invadiram e saquea­ ram a propriedade da Missão. Os dois homens foram maltratados, um deles foi arrastado pelo pátio. Final­ mente foram-se embora os invasores, deixando-os em paz ainda com vida, mas destituídos de todas as posses. Achavam-se em situação extremamente precária — a vários dias de viagem de seus amigos, sem dinheiro, roupa de cama, sem outra roupa que a do corpo, e o frio inverno já ia avançado.

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Em tais extremos, ajoelheram-se, entregando-se ao Senhor. E segundo as Suas promessas, Ele os livrou das aflições, pois, ainda enquanto oravam, estava a caminho um irmão missionário de um campo distante. Chegava de surpresa, sem saber do ocorrido, pouco depois da agitação. O fato de ele ter chegado em mo­ mento tão oportuno encheu de temor os adversários pagãos. Devolveram o dinheiro e os objetos furtados e, daquele dia em diante não houve mais oposição vio­ lenta . Poucos meses depois deste acontecimento, algumas famílias mudaram-se para Honan, e realizou-se uma ocupação permanente; más os corações estavam endu­ recidos contra nós. Tinham-nos ódio e desconfiavam de nós como se fôssemos seus piores inimigos. O dis­ trito em que nos estabelecemos era notório por seu es­ pírito turbulento e contrário aos estrangeiros, por isso o nosso grupo de missionários frequentemente se achava em perigo. Muitas vezes, reconhecemos que nós, bem como os colegas de trabalho em outros lugares, só não fomos atingidos por grandes males porque estávamos sob o poder soberano e protetor de Deusr em resposta às muitas orações que subiam por nós todos, neste mo­ mento crítico na história de nossa Missão. Seguem-se alguns exemplos concretos de como Deus ouviu nossas orações nesta época. Era médico de nossa Missão local, um homem de excelentes dotes. Havia recebido medalha de ouro, tinha anos de estudos especializados e experiência hos­

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pitalar, sendo considerado um dos médicos de maior futuro na cidade de onde vinha. Imaginem então o seu desapontamento e frustração, quando mês após mês se sucedia sem que aparecessem no hospital os bons casos para tratar. O povo não conhecia o que ele era capaz de fazer, e além disso, temia confiar-se às suas mãos. Nós, o grupo local de missionários, come­ çamos a orar especificamente para que Deus mandas­ se ao hospital casos, que pudessem abrir os corações a nós e a nossa mensagem. Dentro de pouco tempo vimos esta oração respon­ dida de modo muito mais perfeito do que antecipava­ mos. Apareceram diversos casos difíceis, quase de uma só vez, e um deles tão sério que o médico hesitou uns dias, antes de operar. Quando finalmente, realizou a operação, suas mãos foram fortalecidas com as nossas orações. O paciente atravessou o período crítico, e dentro de alguns dias estava andando por toda parte, deixando o povo admirado. O sucesso desta e de outras operações críticas era de muita importância. Se os doentes morressem sob os cuidados do médico, havería um pretexto para que destruíssem a propriedade e todos os missionários. Três anos mais tarde, o fichário do hospital registrava o atendimento de 28.000 pessoas em um ano. Também orávamos para que, desde o comêço, Deus nos desse almas convertidas. Sabíamos de missionários na índia, na China, e em outros lugares, que traba­ lharam muitos anos sem ganhar convertidos; entretan­ to, não achávamos que esta fosse a vontade de Deus

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para nós. Críamos que era Seu prazer e propósito, salvar homens e mulheres através de Seus vasos hu­ manos, e por que não desde o princípio? Por isto orávamos e trabalhávamos e esperavamos sem cessar, a fim de que as pessoas se convertessem. B Deus nos deu estas pessoas. A experiência de trinta anos con­ firma este ponto de fé. O espaço é exíguo para relatar mais do que estes dois casos. O primeiro foi o de W ang Feng-ao, que veio co­ nosco para Honan como professor particular do Sr. Goforth. Era homem de alta cultura, tendo o equiva­ lente a. um curso universitário ocidental, e sendo ade­ mais, um dos mais altivos e presunçosos estudantes de Confúcio. Desdenhava os missionários e seus ensinos; fazia-lhes tão forte oposição que batia na esposa cada vez que ela nos visitava ou ouvia nossa mensagem. Porém, o Sr. Goforth orava continuamente pelo ho­ mem, usando toda sua influência para trazê-lo a Cristo. Antes de transcorrerem muitos meses, uma grande transformação operou-se no Sr. W ang. Seu modo ar­ rogante e orgulhoso mudou. Èle tornou-se um humil­ de e dedicado seguidor do modesto Nazareno. Deus usou um sonho para despertar a consciência deste homem — o que não é fora do comum, na China. Certa noite, sonhou ele que se debatia numa cova funda e cheia de lama, e por mais que tentasse, não conseguia escapar dali. Quando estava para desistir, desespera­ do, olhou para cima e viu o Sr. Goforth e mais outro missionário, no barranco, e com as mãos estendidas

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para socorrê-lõ. Procurou outro escape, mas achando outra saída, deixou que êlés o tirassem.

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Mais tarde, este homem tornou-se o evangelista que o Sr. Goforth mais prezava. Durante muitos anos, seus dons esplêndidos serviram à causa do Mestre entre a classe intelectual, no distrito de Changtefu. Há tempo, achou ele o seu galardão. Morreu como viveu, confiando somente nos méritos de Jesus Cristo para a salvação. Outro fio de ouro nas trevas daqueles primeiros dias em Honan, foi a notável conversão de Wang FuLin. Durante muitos anos, sua profissão foi a de con­ tador de histórias; mas quando o Sr. Goforth o co­ nheceu, estava completamente arruinado pelo ópio, que fumava. Aceitou o Evangelho, porém, durante algum tempo parecia não ter forças para libertar-se do vício do ópio. Tentou muitas vezes, mas recaía no vício. O pobre homem parecia não oferecer mais espe­ ranças, quando um dia o Sr. Goforth chegou à Missão, trazendo-o em sua carroça. Os dias que se seguiram, foram inesquecíveis para todos os que presenciaram Wang Fu-Lin lutar pela vida física é espiritual. Creio mesmo, ter sido apenas pela oração, que ele pôde ven­ cer. Ao fim de dez dias estava quebrado o jugo em que o ópio o tinha prêso. Wang Fu-Lin era um novo homem em Cristo Jesus. Tornarei a falar neste homem, mais adiante.

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Em todos os casos de cura divina citados neste re­ lato, notar-se-á que Deus curou em resposta à oração ou quando os médicos já haviam feito tudo o que es­ tava a seu alcance, tendo perdido as esperanças, ou ainda quando estávamos longe demais para obter as­ sistência médica. Pouco depois de sua chegada à China, o Rev. Hunter Corbett, missionário dos mais dedicados, deu um testemunho que mais tarde, Deus usou para sal­ var-me de abandonar o trabalho naquele país e voltar à minha terra, o Canadá. Disse o D r. Corbett ter durante quinze anos, fi­ cado prostrado todos os anos pelo terrível flagelo do Oriente — a disenteria. Finalmente os médicos deci­ diram: deveria ele abandonar a China e voltar imedia­ tamente à Pátria. Mas, disse o grande servo do Senhor: “ Eu sabia que Deus havia-me chamado para a China e sabia também que Deus não muda. O que deveria eu fazer? Não ousava desprezar o meu chamado; deci­ di que se não pudesse viver na China, poderia morrer lá, e daquele dia em diante, a moléstia perdeu sua força sobre mim” . Este testemunho ele o apresentou há mais de vinte e cinco anos, quando já estava na China há quase trinta! Em janeiro de 1920, com perto de noventa anos de idade, este precioso e honrado santo de Deus foi transportado a um serviço mais glorioso. Durante vários anos eu também fôra acometida como o D r. Corbett, pela doença terrível, que a cada ano parecia afligir-me mais fortemente. Um dia, meu

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esposo trouxe a decisão dos médicos — eu deveria voltar. Deitada ali, doente, fraca, senti a tentação de anuir. Lembrei-me, entretanto, do testemunho do Dr. Corbett e do meu próprio chamado. Senti que voltar à minha terra, então, seria contrariar minha consciên­ cia. Decidi fazer como o D r. Corbett — deixar-me nas mãos de Deus — para a vida ou para a morte. Isto aconteceu faz mais de vinte anos, e desde então a mo­ léstia tão temida pouco me te incomodado. Sim, pois, quanto maior a necessidade, quanto mais amarga a angústia, maior é a oportunidade para Deus mostrar seu grande poder em nossas vidas, se Lhe dermos a vez, a Ele obedecendo, irrestritamente, seja qual fôr o preço. “ No dia em que eu clamei, Tu me acudiste, alentaste a fôrça de minha alma” . (Salmo 138:3). Durante nosso quarto ano na China, enquanto passávamos a estação do calor à beira-mar, nosso filhinho de dezoito meses ficou muíto doente com disen­ teria. Após alguns dias de luta pela vida da criança percebemos, certa noite, que o anjo da morte estava perto. Toda a minha alma se rebelou. Parecia mesmo odiar a Deus. Não via senão a injustiça cruel de tudo aquilo, e a criança parecia decair ràpidamente. Meu esposo e eu ajoelhamo-nos ao lado do pequeno leito, e ele me implorou sinceramente que rendesse minha vontade e minha criança a Deus. Após cerrada luta, Deus saiu vitorioso, e eu disse a meu marido que daria

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ao Senhor o meu filho- Meu esposo orou, então, entre­ gando ao Senhor aquela preciosa alma. Enquanto ele orava, notei que a respiração plressuroSa e difícil da criança havia parado. Achando que já morrera o pequeno, corri à procura de luz, pois estava escuro; mas, quando examinei o rostinho dêle, descobri que havia caído num sono profundo e natu­ ral, que durou a maior parte da noite. No dia seguin­ te, estava ele quase curado da disenteria. Sempre me pareceu que o Senhor me provou até quase o último momento; e então, quando rendi a Êle meu mais precioso tesouro, e coloquei Deus em pri­ meiro lugar, Éle devolveu-me o meu filho. Enquanto escrevi o que vai acima, encontrei um trecho extraído do Christian de 12 de março de 1914, no qual diz o editor: “ No discurso que pronunciou por ocasião da reunião anual -do Hospital da Comarca de Iíuntingdon, Lord Sandwich referiu-se ao poder da cura espiritual, e tomando como premissa o fato de que a mente finita não pode medir o poder do infinito, disse ele: “ Aguardo o dia em que a doutrina espiritual da cura e as descobertas fí­ sicas da ciência combinar-se-ão harmoniosamen­ te para a glória de Deus e o benefício da hu­ manidade” .

IV UM CAMPO DADO POR DEUS (1894-1900) Senhor, além de Ti não há quem possa socorrer numa batalha entre o poderoso e o fraco; ajuda-nos, pois, Senhor, nosso Deus, porque em Ti confiamos, e no Teu nome viemos contra esta multidão. II Crônicas 14:11. A história da abertura de Changte é tão ligada por uma corrente de orações, que dar fatos isolados de ora­ ção seria quebrar a corrente. Alguns meses depois de entrarmos na China, um missionário de mais idade e experiência, bondosamente ofereceu-se para levar o S r. Goforth e seu colega, que acabavam de chegar, através de Honan do Norte, a fim de conhecerem o campo pessoalmente. Viajando de carroça em direção ao Sul cruzaram a fronteira de Honan certa manhã, bem cedo. Enquanto meu esposo andava ao lado das carroças nas primeiras horas do dia, achou-se guiado por Deus para orar, pe­ dindo que Ele lhe desse esta parte de Honan como seu campo. E veio-lhe a certeza de que lhe foi concedida sua petição. Abriu o livro de leituras diárias, e desco­ briu a passagem para aquela manhã, em Isaías 55 :8-13. As palavras soaram como preciosa promessa de bênçãos

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futuras para aquele campo: “ Assim como descem a chu­ va e a neve dos céus, e para lá não tornam, sem que primeiro reguem a terra e a fecundem e a façam brotar para dar semente ao semeador e pão ao que come, assim será a palavra que sair da Minha bôca; não voltará para Mim vazia” . Durante seis anos, porém, nossa fé foi duramente provada. Entre tantos lugares, Changte parecia o mais re­ solvido a impedir a entrada do missionário. E outras dificuldades apareceram no caminho. Com a chegada de mais missionários foi formado um presbitério, e tudo precisava ser resolvido por este concilio. Dois pontos já abertos, onde era preciso primeiro firmar a obra. exigiam o pessoal que tínhamos, e mais ainda. Por isso, durante seis anos, as portas para Changte continuavam fechadas. Mas, em todo esse tempo, o Sr. Goforth nunca perdeu de vista a promessa que recebera de Deus, e nunca deixou de acreditar nela. Muitas e muitas vezes, quando o Sr. Goforth e seu colega visitavam a cidade, foram cercados por motins e ameaçados, mostrando-lhes o povo, a maior hostilidade. Porém, finalmente, chegou o dia em que veio a permissão pela qual oraram por tanto tempo, tendo o Prisbitério deferido o pedido para abrirem o trabalho em Changte. Logo na manhã seguinte, o Sr. Goforth pôs-se a caminho daquela cidade, à procura de local apropriado para iniciar a obra a li. Muitas vezes, contou ele como foi que durante todo aquele dia de via­ gem a Changte orou para que Deus abrisse os corações

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daquela gente, preparando-a para dar-lhe o local mais acertado para o trabalho. Lá chegou, e dentro de um mês havia recebido trinta e cinco ofertas de terrenos. Pôde adquirir a propriedade, que em visita anterior, já escolhera como sendo ideal para a missão . Um ano mais tarde, eu também me mudei para lá, para junto de meu marido, com nossos três filhinhos. Picou resolvido que nosso colega cuidaria do evangelisrao fora, enquanto que nós abririamos o trabalho na­ quela sede. A fim de compreenderem o que significou para nós, ver suprida a nossa necessidade, é preciso que saibam qual foi a necessidade. Decidimos desde o início, que ninguém deveria voltar de nossa porta. O S r . Goforth recebia os homens na sala da frente, enquanto que as mulheres e crianças vinham a nossos aposentos particulares. Durante aque­ las primeiras semanas e meses, centenas, e mesmo mi­ lhares, se aglomeravam para ver-nos. Dia após dia, fomos literalmente sitiados. Até na hora das refeições, as janelas se enchiam de rostos. Nessa época, estavam sempre diante de nós estas perguntas: Como aproveitar ao máximo esta oportuni­ dade tremenda, que nunca mais se repetirá, depois de passada a primeira curiosidade? Como ganhar a ami­ zade desta gente, que nos revelava de cem maneiras di­ ferentes o seu ódio e desconfiança? Como alcançar seus corações com nossa bela mensagem do amor de um grande Salvador?

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Tildo o quê podíamos fazer, dia. após dia, erà-upar as forças que Deus nos dava. De nianhã cêdo até à nóitè, às vezes, nove ou dez horas por dia, eontinuanlente nos esforçáVamos, recebendo a população qüe afluíâ e pregando para ela. Meu esposo tinha que fiscalizar o serviço de numerosos trabalhadores, comprar material de construção, e atender a mil e uma coisas necessárias à organização desta nova missão. Além do mais, preci­ sava receber as pessoas que chegavam, e pregar-lhés o Evangelho. Não contava com um evangelista, visto que o Sr. W ang estava, na época, emprestado ao Sr. MacGEu tinha os três filhinhos, e não tinha babá, nem evan­ gelista (uma evangelista era sempre chamada de “ mu­ lher da Bíblia” ) . Quando me cansava a ponto de não agiientar mais falar ao pátio cheio de mulheres, man­ dava chamar meu marido. Embora estivesse cansado também, ele falava no meu lugar. Depois, nós mesmos descansavamos e entretínhamos o povo, cantando juntos um hino. Assim se passavam os dias. Porém, logo compreen­ demos que era necessário vir auxílio, ou ambos poderia­ mos desfalecer. Certo dia, o Sr. Goforth trouxe-me a Bíblia aberta na promessa: “ Meu Deus há de suprir cada uma de vossas necessidades” . E perguntou: “ Será que nós cremos isto? Se cremos, então Deus pode e vai dar-nos alguém, que ajude a pregar para tóda essa gente, se pedirmos com fé ” . Ele orou muito especialmente para que viesse um homem para pregar. E eu, que tinha o coração cegado

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pela dúvida* achei que era pedir chuva de um céu sem nuvens. Contudo* ainda enquanto ele orava, Deus agia fazendo com que alguém se dirigisse á nós. Um ou dois dias mais tarde, apareceu ali na missão o homem con­ vertido do Ópio, W ang Fu-Lin, cuja conversão jã relatei. Ninguém diria ser ele uma resposta às nossas orar ções. Magérrimo, por cãusa dos anos do abuso do ó p io ; atormentado pela tosse, que três anos mais tarde lhe. pôs têrmo à vida; tão maltrapilho como um mendigo, sua aparência era de causar d ó . Mas, o Senhor não vê como vê o homem. Depois de uma consulta, o Sr. Goforth resolveu ex­ perimentá-lo por alguns dias, convencido de que seria de valor pelo menos o seu testemunho do poder de Deus para salvar o homem do ópio. Daí a pouco éle estava apresentável, vestido com umas roupas chinesas de meu marido, é dentro de uma ou duas horas depois que en­ trara pelas portas da missão, quase mendigo, lá estava assentado à frente da capela dos homens, tão mudado, que era quase irreconhecível. Desde o primeiro dia de seu ministério em Changte não houve dúvida na mente de quem o ouvia, de que éle fôra mesmo enviado por nosso bom Deus, pois, pos­ suía a unção e o poder do Espírito Santo, em grau ex­ traordinário. Seus dons de oratória foram todos consa­ grados a um objetivo único — ganhar almas para Cristo Jesus. Consciente de que seus dias estavam contados, falava sempre como quem antevia a morte para si e para os outros. Não é, portanto de admirar, que desde o princípio de seu ministério em nossa capelinha, os

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homens se convertessem a Cristo. Dens o deixou conosco para lançamento do alicerce da igreja em Changte, e depois o chamou para um pôsto mais alto. A dificuldade do Sr. Goforth foi resolvida com a chegada de W ang Fu-Lin, mas não a minha. Entretan­ to, a maneira toda especial como Deus o tinha enviado, deu-me coragem e fé para confiar que Deus me daria uma evangelista. Quem conhece o trabalho missionário na China, concordará comigo que é muito mais difícil achar mulheres do que homens habilitados para a pre­ gação do Evangelho; e as mulheres, além de serem aptas, precisam estar livres para se dedicar a este tra­ balho. Mas, eu estava começando a aprender que Deus só é limitado pela incredulidade do ser humano; que Ele está sempre pronto a dar-nos mais do que pe­ dimos, se fizermos a nosso parte conforme Èle explica tão claramente em Sua Palavra. Pouco depois de eu começar a pedir especialmente que meu Pai me enviasse uma senhora evangelista, o Sr. MacG — chegou de uma viagem, e cumprimentou-me com estas palavras: “ Bem, Sra. Goforth, creio que temos uma evangelista, de encomenda para a senhora!” Contou-me como foi que descobriu uma viúva com um filho, numa vila nas montanhas. Ela ouvira o Evan­ gelho de um crente recém-convertido, de outro lugar. O homem pertencia à mesma seita religiosa que a viúva e o filho. Quando descobriu a Cristo, pensou logo nosamigos, e atravessou a montanha para levar-lhes a nova. A Sra. Chang recebeu o Evangelho com alegria. Tinha sido pregadora daquela seita pagã, tendo assim adqui­

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rido a fluência no falar e o poder de cativar auditórios, requisitos que são imprescindíveis à evangelização. Em pouco tempo, abriu-se o caminho para ela vir até nós. E tornou-se ela inseparável companheira, e valiosa ajudadora no trabalho feminino durante aquèles primeiros anos. Em 1900, ela deu seu bom testemu­ nho — pois, foi pendurada pelos dedos polegares, quan­ do se recusou a negar a Cristo. Fielmente serviu ao Senhor como evangelista até a sua morte em 1903. Durante os dois ou três primeiros anos em Chang Te Fu, moramos em casas chinesas insalubres, baixas e úmidas. Ficou resolvido construir-se uma casa semiestrangeira para nós. A obra ia muito bem na época — cada semana, às vezes, cada dia, acrescentavam-se novas conversões — e temíamos que a nova casa impedisse a causa, constituindo-se numa barreira entre nós e o povo. Oramos, portanto, para que Deus fizesse a casa ser um meio de alcançar mais pessoas — que ela fôsse benção e não empecilho. A resposta a esta oração, como tantas vèzes acontece, dependia muito de nós mesmos. Tínha­ mos que ser preparados para nos sujeitarmos a pagar o preço, que a resposta exigia. Em outras palavras, chegamos a reconhecer que para a oração ser atendida seria preciso manter a casa aberta todos os dias e todas as horas, o que não era nada fácil. Houve quem dissesse que estava errado, e que os chineses nos menosprezariam; outros diziam que havia perigo de infecção, em que incorriam nossos filhinhos. Porém, com o passar do tempo, a experiência provou serem infundadas estas objeções. Eecebemos ali, pes­

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soas da mais alta classe, b em . como da mais baixa, e serviu isto para conquistar-lhes a amizade. Também, se não me falha a memória, nossas crianças nunca foram contagiadas por causa deste sistema de receber as pes­ soas em casa. Chegamos à cifra máxima em número de visitas, na primavera de 1899, quando em um só dia recebemos 1.835 homens e várias centenas de mulheres. Primeiro, pregávamos para estas pessoas em grupos grandes, e depois as levávamos pela casa. Vimos provas da eficá­ cia deste plano em todos os pontos do nosso cam po. Poi um método pelo qual os corações se abriam a nós, e po­ díamos afastar as suspeitas de desconfiança, melhor do que por qualquer outro plano. Em maio de 1898, viajamos para Tienstsin, de sam­ pana (embarcação, que serve de habitação) com as cri­ anças, pois precisávamos muito déste descanso e da mu­ dança de atividade. O tempo m udou: tornou-se frio e chuvoso. Doze dias mais tarde, quando já avistávamos Tientsin e soprava um vento gélido do Norte, nosso filho mais velho subiu ao convés sem o agasalho, desobedecen­ do à minha ordem. Pouco depois, o menino desceu tiritando de fr io . Naquela tarde, quando chegamos a Tient­ sin, o médico pronunciou o diagnóstico — pneumonia. No dia seguinte, logo depois do meio-dia, um se­ gundo médico, chamado para consulta com o primeiro, encontrou-se com uma pessoa amiga ao deixar o leito do pequeno, e disse-lhe que achava, a criança não re­ sistiría passar a noite. Eu tirei a temperatura, que já era de 41 graus. O menino estava irrequieto, em extre­

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mo agitado pela febre ardente. Sentei-me ao seu lado, clamando ao Senhor para que me ajudasse, e disse bem claràmente: “ P— , você me desobedeceu, e assim trouxe sóbrè você mesmo esta doença. Bu o perdoo; peça a Jesus que o perdoe, e dê-Lhe a sua vida” . A criança olhou-me firme por um instante, depois fechou os olhos. Vi o movimento de seus lábios, e depois, cálmamente adormeceu. Quando acordou, ao cair da noite, tirei a temperatura e era de 38 graus. Quando o médico chegou, já estava normal, e não subiu mais. O menino tinha tido hemorragia dos pulmões, mas isto passou. Não é verdade que Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e eternamente? Por que, pois, admirarmo-nos de que Ele possa tocar e curar na época atual? “ Faça-se conforme a vossa fé ” . Durante aqueles primeiros anos pioneiros, quando lançávamos os alicerces da Igreja de Changte, minha própria fé tão pequena muitas vezes via-se censurada pelos resultados, que operavam a fé simples e pueril de nossos cristãos chineses. Eram tão extraordinárias al­ gumas destas respostas à oração, que ao relatá-las em meu país, até alguns dos ministros achavam-nas incrí­ veis. Mas, eu sei que são verdade, louvado seja Deus. Bis aqui dois exemplos concretos. Li-ming, um evangelista sincero e bondoso, possuía terras a uns quilômetros para o Norte de Chang Te Fu. Certa vez, quando visitava o local, achou os vizinhos ocupados em cercarem seus campos com pauzinhos, por­

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tando minúsculas bandeiras. Acreditavam que isto im­ pediría os gafanhotos de comerem o cereal. Todos acon­ selhavam Li-ming a fazer o mesmo, cultuando o deus dos gafanhotos, porque senão o seu cereal seria destruí­ do. Li-mig respondeu-lhes: “ Eu adoro ao Deus único e verdadeiro, e vou orar para que Ele proteja a minha colheita, para que vocês saibam que Ele é Deus” . Os gafanhotos vieram e comeram aos lados do cereal de Li-ming, mas não tocaram no seu. Quando o Sr. Goforth soube disto, resolveu buscar mais provas: ele mesmo foi ao lugar e inquiriu daqueles vizinhos pagãos de Li-ming a respeito do caso. Cada um e todos eles tes­ tificaram que quando os gafanhotos vieram, o grão deles foi comido e o de Li-ming, não. O Senhor Jesus disse certa vez, após um conflito com a falta de fé e a hipocrisia: “ Graças Te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos” . Nossa pequena Gracie foi acometida por moléstia terrivelmente fatal, eomum em áreas maleitosas — era a dilatação do baço. Os médicos pronunciaram o caso como incurável. Certo dia, entrou uma senhora cristã chinesa com seu filhinho, de cerca da mesma idade de Gracie, gravemente enfermo com o mesmo mal. A pobre mãe estava aflita porque o médico lhe dissera também que não havia esperança. Ela pensou que se insistisse com o médico, ele poderia salvar seu filho. Pinalmente o Sr. Goforth apontou para nossa filhinha Gracie, di­ zendo : “ Na verdade, se o médico não pode salvar a nossa criança, nem tampouco poderá salvar a sua; a única

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esperança para a senhora e para nós está no próprio Senhor Jesus” . A mãe era mulher pobre, trabalhadora, ignorante, mas possuía a fé simples de uma criança. Algumas se­ manas depois ela voltou e contou-nos a seguinte história: “ Quando o pastor me disse que minha única espe­ rança estava no Senhor, eu o c r i. Chegando a casa cha­ mei meu marido, e juntos entregamos nosso filho nas mãos do Senhor. Eu tinha tanta certeza de que a cri­ ança ia sarar, que não cuidei dele mais do que de uma criança sadia. Dentro de umas duas semanas ele pare­ cia estar tão forte que eu o levei de nòvo ao médico, e o doutor disse que não podia descobrir nada de anor­ mal” . Aquela criança chinesa é hoje um homem adulto, sadio. E nossa criança morreu. Entretanto, nós havía­ mos orado por ela como poucos talvez, já oraram por qúalquer crança. Por que, então, ela não nos foi pou­ pada? Não sei. Mas sei que havia em minha vida, na­ quela época, o pecado de amargura para com outra pessoa, e eu não tinha o desejo de perdoá-la. Era o su­ ficiente para impedir qualquer oração, e durante anos me atrapalhou, até que a situação endireitou-se. Será que este caso de oração que não obteve res­ posta abalou minha fé na vontade e no poder de Deus para atender as orações? Não. De modo nenhum. Seria o mesmo que meu próprio filho resolver nunca mais me pedir nada porque eu, com ciência superior à dele, lhe negasse um pedido. Não é verdade, então, que em nossas relações humanas com nossos filhos achamos por

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bem conceder-lhes em uma oportunidade o que lhes re­ cusamos em outra? “ O que Eu faço não o sabes agora, compreendê-lo-ás depois” . E eu tive uma das mais preciosas experiências da grande misericórdia de Deus, em relação à morte de nossa Gracie. Fomos avisados de que a morte prová­ velmente viria em convulsões. Dois de nossos filhos haviam morrido assim. Somente a mãe que já passou por isso pode compreender plenamente o horror que é antecipar esta possibilidade a qualquer momento. Uma noite, eu vigiava junto à pequena, e a Senhorita P— estava comigo, quando de repente a menina pediu decididamente: “ Chame o papai, quero ver o papai” . Hesitei em acordar o pai, porque era a sua vez de descansar; e tentei protelar com alguma desculpa; mas ela insistiu no pedido. Chamei-o então, pedindo-lhe que a tomasse e andasse com ela até eu voltar. Fui ao cômodo vizinho e clamei em agonia ao Senhor para que não deixasse Gracie sofrer; se fôsse mesmo de Sua vontade levar a criança, que o fizesse sem que ela sofresse. Orando, senti uma paz maravilho­ sa descer sobre mim, vindo-me a promessa tão clara­ mente como se fôsse enunciada ali: “ Antes que clamem, Eu responderei; estando èles ainda falando, Eu os ou­ virei” . Levantando-me, fui à porta e eneontrei-me com a Senhorita P— que vinha dizer-me: “ Gracie está com Jesus” . Enquanto eu estava de joelhos, nossa amada filhinha, depois de descansar alguns momentos nos braços do pai, olhou para o seu rosto com um de seus mais bçlos sorrisos, e então fechou os olhos e parou de

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respirar. Não se debateu, não teve dor, mas adormeceu tranqüilamente. “ Como um pai se compadece. . . assim o Senhor se compadece” . Nuvens cada vez mais pesadas nos cercavam du­ rante os meses, que se seguiram à morte de Gracie. Embora a tempestade não eclodisse em sua fúria antes do comêço do verão de 1900, o inverno precedente foi cheio de forças ameaçadoras e de alarmas constantes. Em certa ocasião, milhares de pessoas reuniram-se dentro e fora de nossa missão, mal intencionadas, evi­ dentemente . Meu esposo e seus colegas locomoveram-se, entrando e saindo durante o dia, entre as turbas com­ pactas, que enchiam os pátios àá frente, enquanto que nós, mulheres, ficavamos encerradas dentro de casas fechadas, sem saber a que momento a multidão irrompe­ ría desenfreada para destruir-nos a todos. O que foi que a deteve durante todo aquèle dia? Sómente a oração da fé ! E o Senhor atendeu as orações daquele dia e conteve a violência dos inimigos. Não o sabíamos na ocasião, mas, aquelas experiên­ cias preparavam-nos para as provações e os perigos maiores, que nos aguardavam a todos, mais adiante.

V LIVRAM E N TO D A R E B E LIÃ O DOS “ B O X E R S ” (1900) O nosso Deus é o Deus libertador. - Salmo - 68:20 O qual nos livrou e livrará de tão grande morte, em quem temos esperado que ainda continuará a livrar-nos. II Coríntios 1:10. Muitas vezes, em nossa pátria, fomos convidados a contar a história de como escapamos durante a In­ surreição Boxer, e muitas vezes ouvimos esta pergunta: “ Se foi mesmo o poder de Deus que operou a sua sal­ vação e a de outros naquela viagem, então por que Ele não salvou aqueles Seus filhos, que foram trucidados tão cruelmente? Durante algum tempo a pergunta causou-me pre­ ocupação. Então por quê? Um dia, quando eu busca­ va esclarecimento, fui levada a ler Atos 12. A li en­ contrei a única solução, que pode haver para o caso. O versículo 2 conta que Tiago foi morto a espada; de­ pois, o resto do capítulo relata minuciosamente o li­ vramento maravilhoso de Pedro, em resposta à ora­ ção (versículos 5 a 1 2 ). Tenho para mim que naquele dia em que tudo fôr revelado, compreenderemos que a

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oração muito tem a ver com o livramento realizado. Quando chegou ao Canadá o primeiro cabograma in­ formando a igreja-mãe de que o nosso grupo encetara a viagem perigosa, soubemos depois, que uma onda de oração subiu em nosso favor, de cristãos de todas as denominações. A Assembléia Geral Presbiteriana do Canadá estava reunida na época, e uma sessão fói in­ tegralmente dedicada às orações em favor dos missioná­ rios na China. Jamais testemunhara aquela colenda assembléia um período de intercessão tão intenso e tão unido. Mais tarde, em minha terra, quando contei a his­ tória do nosso escape, repetidas vezes pessoas nos pro­ curaram para contar-nos que durante as semanas transcorridas entre o primeiro cabograma informando a igreja do perigo que corríamos e o segundo, que da­ va a notícia de termos chegado a salvo ao litoral, elas nunca cessaram de clamar a Deus para que Êle nos salvasse. E mais, depois de tudo dito, precisamos crer que Deus foi glorificado e os Seus propósitos foram cumpridos pela morte de uns como pela vida e salvação de outros. O sangue dos mártires é ainda a semente da igreja. Deu-se no mês de junho de 1895 um fato que sempre em minha lembrança está relacionado com |os even­ tos de 1900. Eu me preparava para sair de Toronto com os quatro filhos, com destino à China, onde meu espôso já me esparava. Chegou um cabograma, contan­ do do cruel massacre do Sr. e Sra. Stewart e outros. Recebemos expressões de sentimentos e de ansiedade pelos missionários em geral, em tõda a China. Muitos

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instaram conosco para que adiássemos nossa volta; mas, achei que era melhor seguir o plano original e poucos dias depois, nos despedíamos dos amigos, na estação ferroviária de Toronto. O comboio partia, quando uma senhora se aproxi­ mou depressa da janela e disse: “ A senhora não me conhece, mas eu orei, pedindo a Deus uma promessa para os senhores; aqui está, e recebam-na como vinda dílle” . Deu-me ela um papelzinho, e abrindo-o, li: “ Toda arma forjada contra ti, não prosperará” . (Isaías 5 4:1 7 ). A li mesmo elevei meu coração a Deus em oração, pedindo que Ele cumprisse esta promessa para mim e para os meus; e orando, veio-me a convic­ ção segura de que o Senhor ouvia. Nunca poderemos esquecer aquéle inverno de 1899-1900. As nuvens se amontoavam, e os rumores que prenunciavam a tempestade faziam-se ouvir de to­ dos os lados. Kepetidas vezes, nós como missão, aios achávamos em meio ao perigo mais grave, e nestas oca­ siões ficávamos a sós com Deus. O estado de nervos do povo era tal que o mínimo incidente teria sido como faísca na pólvora. Começando com a crise governamental do outono de 1899, nós, bem como todos os demais estrangeiros na China, percebemos que as condições se tornavam sérias. No entanto, não esperavamos pelo cataclisma que houve quando o temporal desabou, repentinamen­ te em princípios do verão de 1900, e nem estávamos preparados para o mesmo. O primeiro indício de perigo iminente foi o fato de nossos carteiros, que iam a Tientsin e da lá vinham,

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serem interceptados e ser a nossa correspondência de­ volvida. Assim, cortadas as comunicações, para informarmo-nos sobre o que se passava tínhamos de depen­ der somente dos rumores exagerados, que corriam de bôca em bôca entre os chineses. A zona ao nosso redor, dia a dia excitava-se mais. Ouvíamos diariamente o bater dos tambores e o clamor do povo pará obter chu­ va. As trevas e o horror daqueles dias, em meio aos quais entrou a doença e a morte em nossa casa, nunca se apagará de nossa memória. A 19 de junho, nossa filha mais velha, Florence, após uma semana de so­ frimento intenso foi libertada da dor. Foi durante o tempo em que a sua vida ainda oscilava na balança, que recebemos o primeiro comunicado do cônsul ame­ ricano em Chefoo, insistindo para que fugíssemos. Êste comunicado foi logo seguido de outro ainda mais urgente. A pergunta era : Fugir para onde ? Nossa rota usual era de barco, pelo rio, duas semanas até Tientsin, mas, este caminho estava obstruído, visto que a re­ gião tó'da estava infestada de “ Boxers” , e Tientsin já se achava em estado de sítio. O único caminho pelo qual ainda podíamos transitar era em direção ao Sul, de carroça — catorze dias até Fancheng — depois de dez dias ou mais de sampana até Hànkow. Enfrentávamos uma viagem desta natureza, nesta época do ano, com grande temor e tremor por causa das crianças, dado ao perigo grande por causa do calor e do sol. Teríamos preferido ficar, mas os cristãos chineses reco­ mendaram-nos que saíssemos, dizendo-nos que escapa­ riam melhor se não estivéssemos ali.

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Conosco estavam as quatro crianças que restavam: Paulo, com nove anos; Helena, com seis; Rute, com menos de três, e o nenê, Wallace, de oito meses. A fiel ama chinesa, embora chorasse amargamente ao despe­ dir-se da velha mãe de quase oitenta anos, decidiu vir conosco. O grupo consistia, ao todo, de cinco homens, seis mulheres, e cinco crianças, além dos criados e car­ regadores . Eram grandes as dificuldades para se obter car­ roças e outras coisas necessárias à viagem, mas, pouco a pouco conseguimos tudo, à medida que orávamos para o Senhor abrir-nos o caminho. Naquela jornada houve muitas provas evidentes de que o propósito de Deus era salvar-nos. Uma das mais impressionantes ocorreu quando estávamos para sair de casa. No dia anterior à partida, correu uma notícia pela cidade de Chang Te Ho, trazida por um mensageiro que passou em disparada, a cavalo. Este mensageiro, soubemos depois, estava a caminho da Capital da Pro­ víncia com a carta selada da Imperatriz-mãe, ordenan­ do a morte de todos os estrangeiros. Nosso primeiro plano era viajar diretamente para o Sul, o que, até onde podemos avaliar, ter-nos-ia levado todos à morte, pois tal trajeto nos faria passar pela capital. Quase à última hora, e sem conhecer o perigo daquele percur­ so, fomos levados a mudar os planos, escolhendo um ca­ minho mais a Oeste, apesar de que isto encompridaria bastante a viagem. Saímos de Chang Te no dia 28 de junho de 1900, ao raiar do dia. Em Wei Hwei Fu, primeira cidade

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grande à qual chegamos, houve uma tentativa de inva­ são à nossa hospedaria, mas enquanto orávamos a mul­ tidão se dispersou, deixando-nos em paz. A I o . de ju ­ lho chegamos à margem do Rio Amarelo, e ali, por um pouco, pudemos descansar à sombra das árvores (era um domingo à tarde). Estava longe de nós imaginar que, naquele mesmo momento, muitos, um número mui­ to grande mesmo, de nossos colegas missionários e amigos pessoais estavam sendo mortos pelos impiedosos “ Boxers” . A o entardecer, a balsa que nos levou ao ou­ tro lado do rio, chegou à margem sul, e lár encontramos vários missionários e um grupo de engenheiros, espe­ rando por nós. Estes últimos estavam totalmente ar­ mados e mais ou menos bem escoltados. Depois de al­ guma discussão ficou resolvido que o grupo se conser­ vasse junto, porém, na realidade esta comitiva viajava à parte, somente pousando nas mesmas cidades à noi­ te. Cada dia que passava parecia mais difícil que o anterior. O calor era intenso. E as dez ou doze horas, em que suportávamos os solavancos das estradas aci­ dentadas nas carroças sem molas, preparavam-nos pa­ ra achar até o leito estendido no chão, um lugar con­ vidativo para o descanso. Uma vez, quando o Sr. Goforth desceu de nossa carroça a fim de busear água fresca para nossos tur­ bantes, o povo ajuntou-se ao seu redor, era uma turba ameaçadora, gritando: “ Matem, matem” . As outras carroças estavam na frente, e o carroceiro não queria esperar pelo Sr. Goforth, pois estava com medo. Du­ rante os poucos minutos que se passaram antes de dei­ xarem meu esposo voltar para junto de nós, o carro­

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ceiro ficou pálido de susto, em suspense — e como eu orei! Houve mais alguns perigos passageiros, da mesma natureza, mas, nada de especial ocorreu até à noite de 7 de julho, quando chegamos à pequena cidade de Hsintien. Ouvimos durante o dia, que toda a popula­ ção do território à nossa frente estava em efervescên­ cia contra os católicos romanos. Tínhamos acabado de chegar à pensão quando os engenheiros e os missioná­ rios que estavam com eles, cada vez mais assustados eom as condições em que se achava o país, informaramnos de que continuariam a viagem para a grande ci­ dade de Nan Yang F u naquela mesma noite. Entre­ tanto, deixariam conosco dois dos soldados e duas car­ roças. O Sr. Goforth não queria que eles se fôssem, pois sentia que assim o nosso perigo seria ainda mais grave. Logo depois que eles partiram, o povo começou a ajuntar-se fora da pensão em que estávamos. O portão estava cerrado e fizemos barricadas com as carroças. Durante várias horas ouvimos as pedras que eram ar­ remessadas contra o portão e as vozes, exigindo o nos­ so dinheiro. Enviou-se um mensageiro para pedir ao grupo de engenheiros que voltasse. Passamos aquela noite toda em suspense, sem dormir. Cedo de manhã, o mensageiro voltou, trazendo a resposta de que eles não tinham conseguido auxílio com o oficial em Nan Yang Fu, sendo obrigados a pros­ seguir viagem. Logo que os carroceiros souberam que estávamos assim desamparados, foram tomados de pâ­

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nico, e só com dificuldade pudemos persuadi-los a arrearem os animais. Durante todo este tempo, a multi­ dão se adensava, o que podíamos verificar pelas fres­ tas do portão, e o silêncio era ameaçador. Recebêramos insinuações de perigo iminente, mas era só. Ninguém dizia o que todos sentíamos — que provavelmente sai­ riamos dali para morrer. De repente, sem qualquer aviso, fui tomada de um grande mêdo do que poderia esperar-nos. Não era o mêdo do que haveria depois da morte, mas da pro­ vável tortura. Este temor se apossou de mim, de tal maneira, que pensei: “ Será que é esta a coragem cris­ tã, que eu tenho procurado?” Afastei-me e orei, pedin­ do vitória, mas não obtive aju da. Naquele momento, alguém nos chamou a um cômodo para orar, antes de entrarmos nas carroças. Trêmula, que mal podia an­ dar, e envorganhadíssima de que os outros me vissem neste estado de pânico — pois, era sem dúvida isto mesmo — consegui chegar a um banco junto ao qual estava meu marido, de pé. Ele tirou do bolso um livrinho, Clarice’s Scripture Promises (Promessas da Escri­ tura, de Clarke) e leu os versículos, que viu primeiro. Eram os seguintes: “ O Deus eterno é a tua habitação, e por baixo de ti estende os braços eternos: íile expulsou o ini­ migo de diante de ti, e disse: Destruí-o. O Deus de Jacó é o nosso refúgio. Tu és o meu amparo e o meu libertador; não Te detenhas, ó Deus m eu ! Eu te fortaleço e te aju­ do, e te sustento com a minha destra f i e l . .. Eu, o Senhor teu Deus, te tomo pela tua mão direita,

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e te digo: Não temas, que Eu te ajudo. Se Deus é por nós, quem será contra nós? Assim, afirmemos eonfiantemente: O Senhor é o meu auxílio, não temerei, que me poderá fazer o homem?” Foi impressionante o efeito destas palavras numa ocasião como aquela. Todos entendemos que Deus nos falava. Nunca uma mensagem foi dirigida tão direta­ mente ao homem mortal pelo seu Deus, como a nós na­ quele momento. Quase desde o primeiro versículo, toda a minha alma inundou-se de uma grande paz; todo vestígio de pânico desapareceu, e senti que a presença de Deus verdadeiramente estava conosco. De fato, Sua presença era tão real, que seria difícil ser ela mais sen­ tida ainda que a tivéssemos em forma visível. Depois de orar, subimos nas carroças, e uma a uma sairam elas à rua, em meio à aglomeração de povo. Chegando perto do portão da cidade, podíamos ver que a rua estava fervilhando de pessoas, que nos espera­ vam. Acabava eu de comentar com meu esposo, o fato de que estávamos passando até que bem, pelo povo, quando as carroças atravessaram os portões. Meu ma­ rido empalideceu, apontando para um grupo de várias centenas de homens hem armados, que nos aguarda­ vam. Esperaram as carroças todas passarem pela por­ ta da cidade, e depois fizeram cair sobre nós uma chu­ va de pedras, e ao mesmo tempo investiram contra nós, machucando e matando alguns dos animais. O Sr. Goforth saltou de nossa carroça e gritou para eles: “ Ti­ rem tudo, mas não matem” . A única resposta que re­ cebeu foi um golpe. A confusão que se seguiu foi tão

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grande, que seria impossível descrever em pormenores, o escape de cada um. Mais tarde, cada qual deu o seu próprio testemunho daquele livramento. Mas, preciso dar os pormenores da experiência do S r. G oforth. Um homem deu-lhe um golpe com a espada, que brandia com as duas mãos. “ Por acaso” foi o lado cego, que desceu sobre ele. A espada deixou-lhe um vergão em volta do pescoço, mas não lhe causou maior dano. Se o lado cortante o tivesse atingido, èle teria sido decapitado, na certa! Seu capacete espesso ficou estraçalhado, tendo um golpe cortado o fôrro de couro logo acima da fonte, mas nem arranhou-lhe a pele! Novamente foi abatido ao chão, com um tremen­ do corte de espada, que lhe feriu o osso do crânio, qua­ se partindo-o em dois. Quando o missionário caiu, pa­ receu-lhe ouvir distintamente uma voz, que dizia : “ Não tema, estão orando por você” . Levantando-se deste golpe foi atingido de novo por uma cacetada. E enquanto caía no chão meio inconsciente, viu um ca­ valo disparado em sua direção. Ao recuperar os sen­ tidos descobriu que o cavalo havia tropeçado e caído (em terreno plano) tão perto que a cauda quase o to­ cava. O animal, que esperneava furiosamente, havia servido de barreira entre ele e os seus assaltantes. En­ quanto ainda estava confuso e incerto sobre como agir, aproximou-se dele um homem como se fôsse para ata­ cá-lo, e cochichou: “ Deixem as carroças” . Já então os circunstantes começaram a investir para se apossarem do que havia nos veículos, mas os assaltantes conside­

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ravam que as coisas eram suas. Desistiram de atacar as pessoas para conseguirem os seus bens. Agora uma palavra com respeito a mim e às cri­ anças. Vários homens ferozes, armados de espadas, su­ biram na carroça. Um atacou o nenê, mas eu aparei o golpe com uma almofada, e o garotinho só recebeu um pequeno arranhão na testa. Depois, jogaram as espa­ das e começaram a arrancar nossas coisas, que estavam empilhadas na parte de trás. Arrastaram caixas pesa­ das por cima de nós, e levaram tudo. Justo naquele momento, um homem de aspecto pavoroso tentou al­ cançar-nos pelo lado de trás da carroça com sua es­ pada, e por um triz não o conseguiu. Pensei que êle fôsse dar a volta para continuar o ataque, mas não o fêz. Duas vezes vi o Sr. Goforth cair ao chão, todo ensangüentado, e já o tinha por morto. Nisto apareceu Paulo, que viajava no último carro. Subiu ao nosso de um salto, entusiasmado com o que ele achava ser um divertimento, pois tinha atravessado pelo meio do ba­ rulho, evitando as arremetidas de espada de todos os lados, e conseguiu chegar ileso até onde eu estava. Um instante depois, meu esposo chegou ao lado da carroça, dificilmente agüentando-se em pé, e disse: “ Desça de­ pressa; precisamos sair daqui imediatamente” . En­ quanto eu descia, um homem agarrou meu chapéu, ou­ tro, os meus sapatos; mas deixaram-nos ir. Não víamos Rute em parte nenhuma, e esperávamos que ela estivesse com os missionários que tomavam conta dela quando começou o ataque. V i que as forças do Sr. Goforth decaiam ràpidamente, pois, quase não podia caminhar. Havia homens, que nos perseguiam,

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e por isso fiz com que meu esposo seguisse à frente com o nenê e as outras duas crianças. Voltando-me, en­ frentei aqueles homens, rogando que tivessem piedade das crianças, pois haviam começado a apedrejar-nos. Alguns de nós ficamos moídos e marcados durante mui­ tos dias por causa das pedradas daquela hora. Eles pararam e me escutaram. E o chefe do bando disse: “ Já matamos o marido dela, deixem que ela vá” . Com isto correram de volta às carroças. Sabia que o Sr. Goforth não podia ir longe. V i­ mos uma pequena vila não muito distante, e apressamo-nos para lá, orando a fim de que o Senhor abrisse o coração dos habitantes para nos receberem. Mais uma vez, Paulo demonstrou não sentir nenhum temor, pois disse: “ Mamãe, do que isto faz lembrar? Eu me lembro é dos livros de aventuras H e n ty !” Ao chegarmos perto da aldeia, uns homens sairam para mandar-nos embora, mas eu implorei que nos aju­ dassem. O Sr. Goforth já havia caído ao chão. Coloquei o nenê nos braços de uma velhinha, e ajoelhei-me ao ládo de meu espó'so. As crianças choravam de fazer dó. O Sr. Goforth parecia estar morrendo. As mulhe­ res que nos rodearam, já estavam chorando também. Com isto, os homens se comoveram e adiantaram-se, prometendo: “ Nós vamos salvá-los” . Um deles correu a buscar alguma coisa para pôr nos cortes, dizendo que estancaria o sangue, como de fato o fez. Este homem ajudou-me a atar os ferimentos com ataduras feitas de roupas, que tirei de mim mesma e das crianças. Au­ xiliaram meu esposo; e nós os acompanhamos para dentro de um barracãozinho, onde o deitaram sobre

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um leito de palha. Trancaram a porta. Pela janelinha, deram-nos água quente para lavar as machucaduras, comida e água para beber. Podíamos ouví-los, traçan­ do planos para salvar-nos. Dissemos como estávamos ansiosos por notícias dos amigos e de nossa filhinha Rute, e mandaram alguém para saber deles. Descobrimos que estas pessoas — toda aquela al­ deia — eram maometanos, e não haviam tomado parte no assalto. Sentimos que Deus havia dirigido nossos passos àquela vila de modo muito maravilhoso. Durante todo aquele dia, o Sr. Goforth ficou ali deitado. Às vezes parecia tão pálido, que temíamos pe­ lo fim . Creio que não parei de orar pela vida dêle, um só minuto do dia. E quando o Sr. — , um de nosso grupo, chegou lá pelas quatro horas da tarde, à nossa procura, o Sr. Goforth levantou-se de uma vez, como se estivesse perfeitamente são, insistindo em caminhar até a carroça. Para mim, sabendo como ele estivera, parecia um milagre. Quando lhe fiz objeção a isso, respondeu-me ele apenas: “ Ore somente; o Senhor me dará forças enquanto tiver trabalho para eu fazer” . Ao partirmos, os, bondosos amigos daquela vila constrangeram-nos a levar algumas roupas velhas para agasalhar as crianças, que estavam quase nuas. Disseram-nos: “ A noite vai fazer fr io ” . Enquanto seguía­ mos ao encontro dos demais, o Sr. — , contou-nos como foi que de um em um, todos tinham escapado. O D r . — foi o único, além do Sr. Goforth, que ficou gravemen­ te ferido. A rótula do joelho do pobre homem fendeuse, e os tendões do pulso direito foram cortados seve­

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ramente, além de müitos outros ferimentos, que lhe foram infligidos. Durante todo aquele dia, nossos amigos tinham fi­ cado à beira da estrada, sem poder prosseguir sem veículos, devido à condição em que se achavá o médi­ co. Uniram-se ali numa só petição — que Deus indu­ zisse os carroceiros a voltar. Quem conhece a China e os carroceiros pagãos percebe logo ter sido nada menos do que um milagre — o milagre da resposta à oração — que fêz aqueles carroceiros incrédulos aparecerem, de­ pois de tudo quanto passaram. Pois, vieram mesmo, cinco deles, número suficiente, já que não havia mais a nossa bagagem. Soubemos também que nossa fiel ama chinesa, que estava cuidando de Rute, salvara a crian­ ça, com risco da própria vida, deitando-se sôbre a , me­ nina e levando muitas pancadas cruéis, até que a ga­ nância pelos objetos pilhados atraiu os homens para outro lado. Logo nos unimos aos outros da comitiva, e às seis da tarde, chegamos à grande cidade de Nang Yang Pu. O muro da cidade estava enxameado de pessoas, e quando entramos pela porta, as turbas alvoraçadas se comprimiam contra os carros. As vezes, os animais falseavam, parecendo-nos que nada podia evitar que as carroças tombassem. De momento em momento, um tijolo ou uma pedra eram arremessados contra os veículos, e Ouvíamos aquele grito: “ Matem, matem” , o qual uma vez ouvido, jamais sai da lembrança, tanto mais, erguido por umas centenas de vozes talvez. Con­ tudo, o Senhor nos fêz sobreviver, e “ nenhuma arma prosperou” .

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Quando chegamos à pensão, mais de mil homens enfurecidos enchiam o pátio interno. A o descermos da carroça estes homens literalmente nos empurraram adi­ ante deles, forçando-nos a entrar num cômodo, que dentro de poucos momentos estava lotado, a ponto de sufocação* Provàvelmente por uma hora, o povo nos imprensou no canto. Depois, os que estavam fora fi­ caram impacientes por não poderem entrar, e exigiram que fossemos trazidos para fo r a . Conseguimos fazer com que algumas das senhoras não saíssem; mas, nós outros — homens, mulheres e crianças — enfrentamos aquela multidão enfurecida até que com a escuridão da noite veio alívio. Por que não nos mataram ali ? Por que mesmo? Somente o Deus Todo-Poderoso se­ gurou aquela multidão. Logo que chegamos à cidade, enviamos um servo ao oficial, exigindo proteçãp. Estava escuro, quando o homem voltou muito agitado. A história que ‘ele nos contou foi que enquanto esperava a resposta do oficial efecutou dois soldados conversando. Pelo que diziam, entendeu que aquele oficial havia mandado um desta­ camento de cinqüenta soldados para a estrada que tí­ nhamos de tomar, e com a ordem de que todos nós fos­ semos mortos. O oficial temia mandar matar-nos na cidade porque depois poderia ele ser inculpado, ao pas­ so que por este plano poderia alegar que o feito fora praticado por bandidos. O servo tinha tanta certeza de que iríamos ser massacrados, que nem quis mais fi­ car conosco, voltando naquela mesma noite para Honan com a notícia de que nós todos tínhamos sido mortos.

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Consultamo-nos ali para discutir a questão: De­ víamos ficar na cidade e tom ar a pedir proteção ou devíamos continuar a viagem e confiar em Deus para abrir-nos o caminho? Ficou resolvido seguir este últi­ mo plano. Entretanto, por muito tempo os carrocei­ ros recusaram-se terminantemente a ir adiante conos­ co. Outra vez, a oração abriu o caminho, e às duas horas da madrugada, todos estávamos prontos a pros­ seguir. O oficial havia mandado alguns soldados de in­ fantaria para nos guiarem à estrada certa! (a da em­ boscada) . A noite estava bastante escura, e ao passar­ mos pelo portão da cidade notamos algo que parecia ser luzes de aviso, colocadas e em seguida retiradas. Todos nós sentimos, que eram sinais para os que esta­ vam de emboscada mais adiante. A uma pequena dis­ tância da cidade, a uns cem metros talvez, nossas car­ roças pararam de repente. Alguém correu e cochichou, para o Sr. G oforth: “ Não sabemos onde estão Paulct> e o S r .— . ” Fez-se uma busca, mas sem êxito. É preciso descer um véu sobre aquelas horas ter­ ríveis de suspense. Minha fé parecia falhar, e só pude clamar em agonia: “ Se Paulo desapareceu, como pos­ so tornar a confiar em Deus?” Então me lembrei de como Deus havia agido tão maravilhosamente, devofvendo-me a vida de meu querido esposo, e entreguei Paulo em Suas mãos, aguardando o Seu querer. Perdendo a esperança de achar os dois, que fal­ tavam, deixamos atrás uma carroça com um servo de muita confiança, e prosseguimos. Vimos então qual fôra o admirável plano de Deus para n ós. Enquanto

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esperávamos, os soldados tinham adormecido em suas carroças, e só perceberam que nossos carroceiros ti­ nham tomado um desvio, quando estávamos a muitos quilômetros da cidade e além do alcance dos nossos su­ postos assassinos! Os soldados ficaram furiosos quando descobriram a nossa passagem; mas depois de umas ameaças, deixaram-nos e voltaram à cidade. E assim, vimos mais uma vez que Deus foi na verdade, um “ Deus de livramentos” para nós. Uma vez após outra, durante aquele dia fomos cercados pela populaça. Muitas vezes tive a oportu­ nidade de mostrar as roupinhas pobres e sujas, que os maometanos nos haviam oferecido, e narrar a história de como foram dadas, serviu para acalmar o povo, talvez mais do que qualquer outra coisa. Uma vez gri­ taram que queriam tirar da carroça a ama das crian­ ças; mas, orando nós ao Senhor por ela, aquela gente nos deixou em paz, e passamos adiante. Em outra ocasião, um homem agarrou no que restava do capace­ te do S r. Goforth e o desfez em pedaços. Eu tinha tido o pensamento de guardá-lo como troféu, caso es­ capássemos com vida. Já a esta altura, estávamos em condições de cau­ sar dó. A maioria dos homens tinha a cabeça ou os braços enfaixados. O D r .— já não podia nem erguer a cabeça. O que sofremos naquelas carroças, tendo só as duras tábuas debaixo de nós, não é possível contar. Havia nove pessoas em nossa carroça, a qual em cir­ cunstâncias mais favoráveis teria levado quatro ou cinco. A o meio-dia, chegamos a uma cidade grande, onde era preciso parar a fim de que os animais pudes-

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sem descansar e comer. À li vimos de novo, uma prova da misericórdia de Deus para conosco. Justamente quando descíamos de nossos veículos, a multidão começou a ameaçar-nos. Parecia que a nossa hora tinha chegado. Mas, nessa situação crítica, dois jovens da classe oficial, muito bem vestidos, abriram caminho no meio do povo e vieram saudar o Sr. Goforth, muito admirados. Os dois tinham sido recebidos em nossa casa em Chang Te Ho, há tempos atrás. Após as devidas explicações, eles se voltaram rapidamente para o povo, que se ajuntava ali, e contaram quem nós éramos, e qual o trabalho que realizávamos em Chang Te H o. Mudou-se imediatamente a atitude dó povo. Deixaram-nos passar, arranjaram-nos boas acomoda­ ções e alimento, do que aliás, muito precisávamos. No meio do dia, quando um após outro vinha expressar-nos seu sentimento pela perda de Paulo, eu nada pude dizer — aguardava a ação de Deus. Quando o Sr. Goforth explicou aos jovens oficiais o desapare­ cimento de Paulo e do S r .— , mostraram grande inte­ resse, e prometeram enviar homens à procura dèles, imediatamente. Além do que, estes amigos na hora de necessidade, mandaram conosco um homem do distrito para guiar-nos e ajudar-nos. Escreveram também uma carta urgente ao oficial da cidade, na qual deveriamos passar a noite, pedindo-lhe que nos desse uma escolta e nos ajudasse no que fôsse possível. Lá pelas quatro horas da tarde, veio um homem correndo atrás de nós com a venturosa notícia de que Paulo e o Sr. — estavam bem, e nos alcançariam na­ quela noite. Ouvindo isto, minha incredulidade e falta

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de confiança diante da provação, acusou-me, e só pude abaixar a cabeça e soluçar. Oh, como é grande a bon­ dade e misercórdia de Deus! Nunca o Seu amor pare­ ceu-me tão lindo como naquele momento. “ Se os mares todos fossem tinta E o céu sem fim fosse papel, Se as bastes todas fossem penas E os homens todos escrivães, Nem mesmo assim o amor seria Descrito em seu fulgor 6 maravilha soberana É este imenso amor! Naquela noite chegamos ao nosso destino às nove horas, mais ou menos, já tendo viajado dezessete horas p or aquelas estradas, com apenas uma paradinha áo meio-dia. Deus sustentou o Sr. Goforth de maneira ex­ traordinária, pois ele teve de sair na mesma hora para ir à casa do oficial para levar a carta, de que falei. Nò trajeto pelas ruas, o povo quase conseguiu, por várias -vêzes, derrubá-lo, e passar por cima dele; mas, Deus o amparou. Ele conseguiu achar o yamen, sendo recebi­ do com eortezia pelo oficial, que prometeu dar-nos pro­ teção e forneceu uma escolta para êle voltar à hospe­ daria. Quando Paulo e o S r .— chegaram durante aquela noite, em vão tentaram acordar-me. O sono é exigên­ cia da natureza humana. Eu não soube de nada até que acordei sobressaltada às duas da madrugada, mais ou menos. Levantei-me e comecei a procurar Paulo. Nunca poderei esquecer-me daquela cena! Toda a comi­

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tiva estava deitada no chão de terra, prãticamente sem roupa de cama nem colchões. Uma palavra sobre as experiências do S r . — e Paulo: Ambos haviam descido da carroça e vinham atrás, a pé. Aconteceu errarem a estrada no escuro, ficando separados dos demais. Durante aquele dia, muitas vezes, encontraram-se em situação periclitante. A certa altura, cercados por uma violenta multi­ dão, um homem ergueu um porrete acima da cabeça de Paulo, pronto para o abater. O Sr.-— sentiu-se im­ pelido por um poder invisível a gritar bem alto: “ Nós não somos católicos romanos, somos protestantes” - Com isto, o homem abaixou o cacete e exclamou: “ Ora, estes não são os espíritos maus estrangeiros, são os espíritos bons estrangeiros, como aqueles missionários de Chow China K ’eo (Missão do Interior da China). Neste, mesmo lugar, o coração daquela gente voltou a favor deles de um modo espantoso. Um homem deu a Paulo cem cash (cinquenta cruzeiros) para comprar comida; outro homem carregou o garoto às costas, uns bons qui­ lômetros, a fim de dar-lhe algum descanso aos pés do­ loridos. O mésmo homem, quando não mais aguentou levar Paulo, correu à frente, à nossa procura. Quando os nossos dois chegaram à pensão, onde nós recebêra­ mos o auxílio de dois senhores chineses, viram que estes amigos tinham mandado preparar comida e uma padiola com um guia para trazê-los até onde nos achávamos! Menos de uma hora depois que acordei, já está­ vamos novamente na estrada. O oficial cumpriu a pro­

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messa, e uma grande escolta bem montada, acompa­ nhou-nos. Viajamos aquele dia durante vinte horas, e chegamos à meia-noite a Fan Oheng. A li achamos a comitiva dos engenheiros, que nos esperava com barcos alugados. Mas, fomos obrigados a ficar durante vinte e quatro horas na pensão mais horrivelmente suja de todas, em que tivemos a sorte de hospedar-nos, na China. Foi um alívio indizível entrar nas embarca­ ções, embora só tivéssemos as tábuas limpas por cama, e a comida das pessoas de bordo para comer. Levamos dez dias para descer o rio até Hankow. Na família, um atrás do outro, adoeceu. Quando ainda estávamos a um dia de Hankow, um vapor rebocador encontrou-nos, trazendo provisões. Nossas crianças choraram de emoção quando viram pão e leite! Não nos foi permitido parar suficiente tempo em Hankow, como desejávamos, a fim de obter roupas e outras ne­ cessidades, porém fomos obrigados a embarcar pelo primeiro vapor, que saía na manhã seguinte. Tive que tomar emprestado dos companheiros de viagem, algu­ mas roupas para mim mesma e para as crianças. Em Shangai, as ruas achavam-se cheias de solda­ dos marchando, e faziam-se todos os preparativos para um ataque. Soubemos, com grande tristeza, da morte de muitos queridos amigos pelas mãos dos “ Boxers” . Tendo recebido ordem de regressar à pátria pelo pri­ meiro navio, e não possuindo nada além da roupa velha, que trajávamos quando veio a insurreição, como poderiamos em tão pouco tempo preparar-nos para a longa viagem de retorno? Dinheiro não faltou, porque a nossa Junta de Missões mandou-nos por cabograma

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a ordem de pagamento da quantia necessária. O pro­ blema para mim agora era confeccionar roupa para nós seis, apesar da escassez de tempo. Os alfaiates chi­ neses estavam ocupados demais para ajudar e sem má­ quina de costura. Só se podia comprar roupas feitas para o Sr. Goforth e Paulo. Outras não existiam. Mais uma vez verifiquei como a extrema necessi­ dade do homem é apenas a oportunidade de Deus. Ble foi fiel à Sua promessa: “ Deus há de suprir cada uma de vossas necessidades” . Pus-me de joelhos em oração e em agonia, implorando o socorro de Deus, pedindoLhe especialmente que alguém me fôsse mandado a ajudar com as costuras, quando bateram à porta duas senhoras, chamando por mim! Tratava-se de duas des­ conhecidas, que tinham visto nosso nome na lista de refugiados recém-chegados, as quais Deus impeliu a que viessem oferecer-nos ajuda! Ambas trabalharam noite e dia para mim até a hora do embarque. Nunca me esquecerei da amizade cristã e da coopração com que me presentearam naquela emergência. Mas, na corrida em preparar as crianças maiores, negligenciamos as roupinhas do nenê, Wallace. O único jeito seria levar fazenda e fabricar roupinhas para êle durante a viagem. A í nos veio uma bela e preciosa mostra do poder de Deus em responder à oração. Trabalhei desde cedo até a noite, procurando costurar para o pequenino, que não tinha quase o que vestir; mas, ao chegarmos perto de Yokoama, percebi que se acabavam as minhas forças. Não conseguia do­ minar a agulha, por mais que me esforçasse, nem siquer enxergava para enfiar a linha. Dobrei a costura, desci

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ao camarote e, pondo-me de joelhos, abri ao Senhor o meu coração quanto àquele pequeno trabalho. Esgo­ tada demais para lutar em oração, expus-Lhe, sem ar­ ticular palavras, o problema de o nenê estar precisan­ do de roupa. A o levantar-me, senti que o pêso do fardo fôra re­ tirado. Guardei a costura, tranquei-a na mala e fui ao convés, onde me deitei, quase inconsciente devido à exaustão. Não sei exatamente o tempo que se passou, talvez menos de meia-hora, alguém tocou-me no braço, dizendo: “ O vapor ancorou aqui na Baía de Yokoama, tendo vindo pela chata um grande embrulho, que foi jo ­ gado para cima do convés para a senhora” . “ Para m im !” exclamei. “ Não pode ser; não tenho conhecidos no Japão” . Porém, veio-me à idéia: “ É a resposta, que. chegou” . Desci, e lá estava a carta da Sra. O. E., da Missão do Interior da China. Dizia-me que seu filhinho, da mesma idade de Wallace, havià falecido há quatro meses, e que o Senhor a dirigiu para mandar todo o seu enxovalzinho a meu filh o ! A o abrir o pacote, tive diante dos meus olhos tudo o que criança poderia pre­ cisar em um ano ou mais, além de outras coisas úteis também. Se alguém tivesse dito àquela irmã, o de que eu mais precisava, não teria ela feito melhor. Sim, Alguém guiara suas mãos carinhosas. Esse alguém a fi­ zera Seu instrumento, pois ela vivia bem perto dEle como um vaso pronto a ser. por Ele usado. Três dias depois, sofri um colapso; mas, louvado seja o Seu grandioso nome. Êle esteve comigo nas trevas; fez-me atravessar a crise.

VI A PR O V A D A F ID E L ID A D E DE DEUS (1902-1908) O lugar mais seguro. . .

é no caminho do dever.

Um dos resultados de nosso livramento gracioso e misericordioso das mãos dos “ Boxers” foi o; ensejo cada vez maior, de fazer valer as nossas vidas no ser­ viço de Deus — gastando-nos para Ble. O bom Pai Celeste viu isto e aceitou-nos neste espírito, trazendonos por caminhos, que significavam uma entrega com­ pleta, tal como eu nunca antes conhecera. Verdade é que “ Deus não se faz devedor de homem algum” . Quando Ele pede e recebe todo o nosso ser, Ele retribui com aquilo que não tem preço — a Sua própria presença. O custo não é alto quando o com­ paramos com o que Ele nos dá em troca. Nossa ceguei­ ra e nossa relutância em ceder é que o fazem parecer maior. Muitas pessoas têm-me pedido para contar esta his­ tória. Creio que ela encerra uma lição para quantos a ouvem, portanto aqui a exponho, embora para isto tenha de revelar algo muito reservado em minha vida. Depois da experiência entre os “ Boxers” , meu es­ poso voltou à China em 1901, sendo que eu e meus

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filhos para lá fomos no verão de 1902, deixando os dois mais velhos nas escolas de Chefoo, no caminho de Honan. Meu marido foi a Tientsin, esperar-me, e juntos fizemos a jornada de barca para o interior, que levava uns vinte e quatro dias. Durante aqueles dias longos e calmos, em que a embarcação navegava pelo rio, meu marido expôs o plano, que cuidadosamente havia elaborado com respeito ao seu futuro trabalho missionário. Fez-me lembrar que seis missionários, de um ponto que tinha sido destruído pelos “ Boxers” , estavam agora permanentemente situados em Changte; e que esta sede, já bem equipada, não precisava mais de nós, como a princípio. Sentia que era chegada a hora de entregarmo-nos à evangelização das grandes regiões para o norte e nordeste de Changte — de pouco con­ tacto com o Evangelho devido à falta de obreiros. O plano dele era, então, que nós — marido e mulher, com as crianças — fôssemos morar e trabalhar no meio do povo. Para por isto em prática, alugaríamos um centro permanente, onde nos alojaríamos durante um mês, na primeira visita, deixando depois aquele trabalho a cargo de um evangelista. Visitaríamos este lugar e outros trabalhos iniciados, pelo mesmo método, tantas vezes quantas nos fôssem possíveis, durante o ano. O que esta proposta significava para mim, dificil­ mente será compreendido por quem não conhece a China e a vida chinesa. A varíola, a difteria, a febre escarlatina e outras doenças contagiosas são ali epidê­

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micas. Na China, fora os lugares dominados por es­ trangeiros, há absoluta falta de higiene. Quatro filhos nossos haviam morrido. Levar os três pequenos, que estavam comigo a uma situação destas, de perigos inumeráveis, parecia mesmo pisar com eles sobre nm precipício no escuro, e esperar que Deus guardasse. Por outro lado, eu sabia falar a língua, tinha experiência para esta obra, reconhecia que a ne­ cessidade da região sem dúvida, era de estarrecer, e qu não havia outra mulher, que pudesse ir. No íntimo sabia que a chamada vinha de Deus, mas eu não estava disposta a fazer o sacrifício. O único argumento com que eu justificava minha recusa a entrar nesta vida era o risco para as crianças. Bepetidas vezes meu espòso insistiu que “ o lugar mais seguro” para mim e as crianças “ era no caminho do dever” . Eu não poderia guardá-las no lar confor­ tável em Changte, mas “ Deus poderia guardá-las em qualquer parte” . Eu continuava a dizer não. Pouco antes de chegar a nossa casa, rogou-me éle que recon­ siderasse a minha decisão. Quando ainda me recusei terminantemente a isso, respondeu-me è le: “ Temo pelas crianças” . No dia seguinte ao de nossa chegada, nosso queri­ do filhinho Wallace adoeceu. Durante várias semanas, lutamos por sua vida. Finalmente passou a crise e ele começou a recobrar as forças. Então meu esposo saiu sozinho para fazer a primeira viagem! Um dia ou dois após sua saída, nossa preciosa Constance, que tinha um ano de idade, foi acometida da mesma doença de Wal-

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lace. Desde o começo houve pouco ou nenhuma espe­ rança para ela. Os médicos, a enfermeira, todo o pe­ queno círculo do pessoal missionário uniu-se na bata­ lha pela sua vida. Mandaram chamar o pai, mas ele chegou quando ela estava perdendo a consciência. Umas horas mais tarde, quando ajoelhados ao redor de seu leito, aguardávamos o fim, meus olhos abriram-se repentinamente para o que eu estava fazendo — pois, eu ousara lutar contra o Deus Todo-Poãeroso. Nos momentos seguintes, Deus revelou-Se a mim com tal amor, majestade è glória que eu me entreguei a Êle com alegria indizível. Reconhecí então, que eu cometera um erro tremendo, e que poderia, é claro, confiar a íüle os meus filhos, aonde Éle quisesse. Só uma coisa fazia-se patente — eu precisava seguir para onde quer que Deus guiasse. Finalmente enxerguei que Deus deveria ter o primeiro lugar. Antes de fazermos o enterro daquele precioso corpinho, demos andamento aos preparativos de nossa primeira viagem. Será que Deus foi fiel à visão que me deu? Ou permitiu que as crianças sofressem nos anos que se se­ guiram, vivendo nós vários meses cada ano, com éles ali no meio do povo? Ao escrever isto, testifico que se passaram dezoito anos desde que iniciamos aquela pri­ meira viagem juntos, e nenhum de nossos filhos fale­ ceu. Nunca tivemos tão pouca doença como enquanto fizemos aquela vida. Nunca experimentamos tanto o favor e a benção de Deus em centenas de modos — como se torna claro nos testemunhos que passo a re­ latar .

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Sem nenhuma exceção, cada ponto em que ficamos por um mês, abrindo trabalho conforme o plano que meu esposo havia elaborado, tomou-se mais tarde uma igreja crescente. E descobri, para surpresa minha, que podia dar mais tempo às crianças, podendo zelar melhor delas naquelas viagens do que na missão em Changte. O ter­ reno da sede missionária era espaçoso, e muitas vezes, meus filhos ficavam longe da vista, várias horas de uma vez; ao passo que nos lugares fora, os locais em que morávamos eram tão pequenos que as crianças es­ tavam sempre ao alcance dos nossos olhos. Mesmo quando havia grupos de mulheres ali, ouvindo o Evan­ gelho, eu podia dirigir as lições das crianças. Recor­ dando aquele tempo, meu coração se enche de gratidão transbordante a Deus pela graça e pelas forças, que Ble me deu para aquele tipo de vida. Só me arrependo de não ter feito um registro de todas as orações respondidas. É muito difícil agora, lembrar com exatidão o que significava naquela época “ pedir e receber as coisas de Deus” , mas parece-me ter sido este o fundamento verdadeiro de toda aquela exisr tência. Os exemplos de respostas à oração, aqui narra­ dos, são apenas os que mais elaramente se destacam à lembrança daqueles anos. A primeira resposta veio no dia depois do faleci­ mento da pequenina Constance, tendo efeito de maior alcance na vida e na obra iniciada. Quando pensava em enfrentar a multidão de mu­ lheres pagãs dia após dia, e no que significava empre­

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ender um evangelismo agressivo lá fora, uma necessi­ dade eu senti ser inadiável — a de uma evangelista. Orei por direção. Veio-mè à lembrança, a Sra. Wang Hsieh-sheng como a quem eu deveria convidar. A o apresentar-lhe o convite para ficar comigo, ela caiu em pranto, dizendo “ Não tenho coragem. Só me resta uma filhinha, e seria arriscar muito a vida dela” . Diante dessa reação, não insisti, porém disse-lhe que fôsse orar durante o dia, e viesse dar-me a respos­ ta depois do enterro, naquela noite. Ã hora combinada, ela chegou. Seu rosto reluzia através das lágrimas, quando me disse: “ Ó pastôra-mãe, eu vou. Se a senho­ ra está pronta a arriscar os seus filhos por amor de minhas irmãs, quanto mais devo eu fazer!” Passaram-se dezoito anos. Teria de escrever um livro inteiro para contar tudo o que a Sra. W ang sig­ nificou para mim naqueles anos. Sim, e para o traba­ lho também. Com o passar do tempo, tornou-se ela a minha amada companheira, repartindo conosco as res­ ponsabilidades e as agruras daquela vida, e também as alègrias. Percebi mais e mais que foi realmente de Deus que recebemos esta cooperadora, Embora as cir­ cunstâncias me tenham afastado daquela obra, esta evangelista lá continuou trabalhando pelas irmãs da Igreja de Ghangte. Palavra das mais duras para um missionário re­ ceber da Junta de sua terra é a ordem de reduzir a velocidade. Meu esposo e eu estávamos fazendo uma de nossas viagens evangelísticas ao norte de Changte. Todas as portas pareciam escancarar-se diante de nós.

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0 tempo parecia propício a uma campanha agressiva especial de evangelização. Quando planejávamos isto, o tesoureiro local da missão escreveu-nos que recebe­ ra um comunicado da Junta, avisando que os fundos estavam reduzidos, e era necessário fazer um corte nos orçamentos, e economias em todos os sentidos. Para nós, isto significava despedir auxiliares e li­ mitar, em geral, o nosso trabalho. Atacamos o proble­ ma de frente. Já de há muito que havíamos gasto de nosso próprio dinheiro mais do que o dízimo para o trabalho. Como poderiamos então, sustentar o pessoal que tínhamos e continuar a obra, que agora oferecia tão gloriosas oportunidades, após anos de árduo labor inicial? Decidimos continuar conforme o planejado, con­ fiando que Deus proveria os fundos necessários. Críamos que, embora a igreja-mãe temporariamente nos tivesse falhado, Deus não faltaria. Na sexta-feira seguinte chegou correspondência para nós, e entre as cartas havia uma de certa senhora da Nova Zelândia. Dizia ter lido uma carta nossa pu­ blicada em “ The L ife o f Faith” (A Vida de F é ), e desejava ela sustentar um evangelista sob nossa dire­ ção. Isto nos deixou descansados quanto ao sustento de um homem, mas havia muitas outras necessidades ainda por suprir. Na remessa seguinte de correspondência, vinda logo na segunda-feira, recebemos uma carta de uma senhora da Austrália, enviando um cheque na impor­ tância mais do que suficiente para todas as despesas

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especiais que o trabalho exigiría durante o ano. Ex­ plicou ela claramente que não queria que o dinheiro fôsse incluído nos fundos gerais da missão, mas que fôsse usado por nós, como achássemos melhor. Nem que ela estivesse a par das circunstâncias em que a carta iria encontrar-nos, não podería ter escrito mais a res­ peito de nossa situação. Outra vez, um ano após esta experiência da fide­ lidade de Deus em suprir o que nos era necessário, co­ meçamos a sentir a falta de recursos especiais. Meu esposo, como sempre, parecia estar seguro de que devía­ mos continuar como vínhamos fazendo. Aparecería o dinheiro para as despesas. Apesar de todas as aben­ çoadas lições do passado, minha fé era pouca. Fui de­ cididamente contra o uso de nosso salário, pois que pre­ cisavamos dele para nós e para a educação de nossos filhos. Estávamos voltando de carroça para casa, na ocasião, e deixamos o assunto, mas senti que meu es­ poso ficou magoado com a minha falta de fé. Chegando a casa naquela noite, aguardava meu esposo uma carta de uma senhora do Canadá. ííle a leu primeiro. Nunca me esquecerei da expressão de seu rosto quando ma entregou, dizendo: “ Eu não disse?” Se não me falha a memória, a carta dizia mais ou menos isto : “ Minha mãe e eu somos completamente es­ tranhas aos senhores, jamais vimos o senhor ou a sua esposa. Mas, faz algum tempo que minha mãe inválida sente-se inquieta por causa de uma convicção que lhe veio de que deve mandar-lhes algum dinheiro. Então,

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para sossegar minha mãe, envio-lhes cinqüenta dóla­ res” . Li a carta. B como me senti envergonhada de minha falta de fé ! Escrevendo nosso agradecimento, contei como foi maravilhosamente oportuna está oferta. Uns dois meses mais tarde, veio a resposta, informan­ do-nos de que a mãe inválida veio a falecer pouco depois da chegada de minha carta; e que o modo como Deus usou sua fé foi para ela uma benção, ajudando-a nos dias em que findava sua vida. Certa ocasião, quando viajavamos de Wuanhsien a Pengcheng, chegamos à cidade de Hotsun à tardi­ nha, esperando pernoitar ali. Mas, ao chegarmos, des­ cobrimos que o crente que mandamos adiante de nós para arranjar acomodações não as tinha conseguido. Todos recusaram-se a receber-nos. Enquanto os ani­ mais comiam a ração, e nós tentavamos jantar nossa massa chinesa, no meio de uma multidão de curiosos, meu marido pediu ao homem que tornasse a procurar um lugar para nós, enquanto orávamos. Não ousamos fechar os olhos, a fim de que o povo pagão e supersticioso, que nos cercava, não ficasse apa­ vorado, pensando que estivéssemos procurando magnetizá-lo. Portanto, apenas elevamos nosso coração silenciqgamente a nosso Pai. Antes que se passassem muitos minutos, antes mesmo de havermos terminado a refei­ ção, aquele crente voltou muito mais alegre, dizendo: “ Um homem rico oferece-lhes um ótimo lugar, que está desocupado e acaba de ser reformado. Diz que podem ficar quanto tempo quiserem, sem pagar aluguel” .

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Por três dias pregamos naquele local — de manhã, ao meio-dia e à noite — e para grandes multidões. Ali se iniciou então, uma obra que continuou. Houve ocasiões em que minha fé foi duramente provada, e temo que algumas vezes, não tenha passado na prova. Porém, quão paciente Deus é conosco, em nossa fragilidade humana! “ Como um pai se compa­ d e c e ... assim o Senhor se compadece” . Os chineses, muitas vèzes, me disseram: “ Seus filhos parecem feitos para esta vida, quo levam” . Mas, eu sei que foi grande a bondade de Deus. Ele sabia como era dura aquela existência, e como teria sido di­ fícil eu continuar a obra, fossem as crianças exigentes ou difíceis de controlar. Muitas e muitas vezes, tive­ mos de acordar os pequeninos antes do amanhecer para iniciar uma viagem de carroça, mas não me lembro de que alguma vez eles tivessem chorado. Acordavam o suficiente para se vestir e perguntar sonolentos: “ Vamos outra vez, mamãe?” , e dormiam de nóvo, tão logo nos acomodavamos nas carroças. Certa vez, chegando a uma cidade, encontramos o lugar onde nos devíamos alojar tão falto de higiene, que era impróprio para as crianças ficarem ali. Era simplesmente horrível. De ambos os lados e quase até a nossa porta havia dois chiqueiros enormes — no es­ tilo chinês! Ã frente da porta havia oito ou dez vasos, cheios de matéria em fermentação, que ali estava nos meses de calor, e que aumentava os odores variados e opressivos. Temi pelas crianças, e quis sair dali ime­ diatamente, mas meu esposo parecia aceitar calmamen­

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te que o Senhor tinha poder para guardá-las de todo perigo. Na segunda noite, a criança menor teve febre. O Sr. Goforth estava dirigindo uma reunião dos homens. Afligia-me o pensamento de que pudesse ser difteria. De joelhos, ao lado da criança, clamei ao Senhor como só pode clamar uma mãe, em tais circunstâncias. Por fim, exausta, ali adormecí ajoelhada. Acordei quando meu esposo entrou. Pus a mão na cabeça da criança mais uma vez. Parecia estar mais fresca. A criança estava mais calma. No dia seguinte estava sã. É de admirar então, eu dizer que sei que Deus atende as orações ? Quando voltamos de nossas férias de verão, em se­ tembro de 1912, esperávamos encontrar uma casa alu­ gada em certo grande centro, onde planejávamos abrir trabalho. Ficamos desapontados ao saber que os evan­ gelistas haviam arranjado uma propriedade numa pe­ quenina cidade de feira, onde havia só um cristão. O único recurso era ir para lá, embora aparentemente fosse quase inútil, sendo aquele o tempo do ano, de maior ocupação daquela gente na lavoura. A caminho do local, oramos muito para que o Senhor preparasse o povo e abrisse os corações ao Evangelho. Ali estávamos há poucos dias e nos con­ vencemos de que nossos passos tinham sido dirigidos para lá, pois que o Senhor abria, de modo extraordi­ nário, os corações. Diàriamente, grandes grupos de homens e mulheres ouviam a pregação. Fomos força­ dos a realizar as reuniões evangelísticas cada noite,

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com órgão e apresentação de hino escrito em rôlo, na via pública, por falta de espaço dentro de casa. Por toda parte encontramos a maior boa-vontade, e um povo amigo, simpático à nossa obra. Antes de findar-se o mês daquela visita, tivemos a alegria de ver algumas das pessoas mais importantes da cidade e do distrito decidirem-se abertamente por Cristo. Um, era o médico mais importante; outro o gerente do merca­ do. Na loja, que nós mulheres tínhamos de atravessar para chegar à reunião, à noite, havia três homens e um rapaz de quinze anos; todos estes foram trazidos a Cristo. Os homens eram viciados ho ópio, indivíduos de má vida. Dois deles tornaram-se pregadores do Evan­ gelho, sendo que um dèles veio a ser o encarregado da pequena igreja formada naquele meio. Se dispusesse de tempo e de espaço, continuaria multiplicando casos de igual transformação, sempre que a cruz de Cristo era o pivô de todo o ensino cristão, e a oração, a fonte de poder. Numa das primeiras visitas feitas à cidade de Linchang, apareceu uma mulher com uma criancinha, cujo pé estava horrivelmente queimado. Todo o pé estava inchado, e a inflamação alcançava até certa altura da perna. A criança tinha febre e parecia estar em perigo de vida. Aconteceu que naquela viagem, eu me esquecera de levar os medicamentos simples, que sempre tinha comigo, e por isso' dissera à mulher, que não era possível fazer nada. Mas, ela suplicou de modo tão comovedor, que não pude despedi-la. Elevando minha alma em oração, pedi ao Senhor que me guiasse, se algo havia que eu pudesse fazer.

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Ainda estava orando, quando me veio à idéia, aplicar um cataplasma de pão. O remédio parecia ab­ surdo. Nunca tinha ouvido dizer que se pudesse usar tal coisa naquela circunstância, mas resolvi experimen­ tar. Duas vézes por dia, o pé da criança era lavado, aplicando-se o cataplasma. Vimos com admiração que estava melhorando. Ali ficamos dez dias, e ao sairmos, o pé da criança estava pràticamente são. A mãe, o pai, a própria criança e a família inteira, mesmo, torna­ ram-se cristãos. Mais tarde, em outra visita, pude ve­ rificar o pé da criança e ver que não ficou sequer uma cicatriz. Contei o fato a um médico e disse éle: “ Ora, na­ quilo não houve milagre nenhum! Foi pura higiene mo­ derna — dando à natureza, oportunidade de agir” . Ao que respondi: “ Doutor, para mim o milagre não estava no cataplasma, mas em Deus ensinar-me o que fazer; e agora, acho mais ainda que foi um mila­ gre de oração, visto o senhor dizer que foi um trata­ mento higiênico moderno” . Na mesma localidade, uns anos depois, realizamos em uma tenda, reuniões especiais para os cristãos du­ rante o dia, e para os não salvos, à noite. Logo depois de iniciadas as reuniões, o tempo mudou. Fazia um frio tremendo, com vento e chuva gélida. A tenda pa­ recia um depósito de gêlo, varrido por correntes de ar. Meu esposo apanhou um forte resfriado, que pio­ rava cada dia. Tinha febre, muita dor de cabeça e dor no peito, mas não queria deixar de fazer as reuniões. Um dia, ele chegou do culto à hora do almoço, com um

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aspecto muito abatido, e deitou-se para descansar até a reunião da tarde. Senti que precisava repartir com os cristãos a minha ansiedade pela saúde do Sr. Goforth. Então, um pouco antes da reunião, da tarde, saí sozinha e con­ videi-os a entrar ,na tenda, onde lhes revelei a condi­ ção de meu esposo, pedindo-lhes que orassem por ele. Ah, que onda de oração sincera e sentida subiu sem um minuto de pausa! As lágrimas brotavam de meus olhos ao pensar: “ Certamente Deus responderá a ora­ ções com estas” . Temendo que meu espóso aparecesse, pedi que cantassem um hino. Poucos momentos depois, ele entrou na tenda, caminhando firme como de costume, com boa aparência. Ao término do culto, contou-me que pouco depois de ouvir-me sair, a dor na cabeça e no peito passara, a febre parecia deixá-lo, e ao sair para a tenda, sentia-se completamente bom. Os sintomas não voltaram. Visitamos certo ponto de pregação, e depois de estarmos dois dias inteiros no local, nenhuma mulher tinha vindo para nos visitar. As condições não me permitiam deixar as crianças, e sair. No terceiro dia, senti em oração, um pêso que me oprimia. Só pude fechar-me num quarto vazio e clamar ao Senhor, pedindo-Lhe que mandasse as mulheres a nós, pois Ele sabia que não podia deixar as crianças. Daquele dia em diante, tivemos visitas bastante com que nos ocupar, fossem senhoras cristãs para estudar ou se­ nhoras pagãs para ouvir o Evangelho.

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Em Tzuchow, primeiro ponto de pregação, que juntos abrimos, o povo se mostrava bastante hóstil a nós. Passado o período inicial de curiosidade, ninguém mais vinha ouvir o Evangelho. Como havia local apro­ priado para as crianças brincarem sob os cuidados da ama de confiança — a que salvou a vida de Rute em 1900 — a Sra. Wang e eu resolvemos sair todas as tardes, a fim de procurar alcançar as mulheres incré­ dulas com o Evangelho. Sempre que saíamos, orava­ mos primeiro ao Senhor para que nos abrisse uma porta para a pregação. Recordando agora a experiência, não me lembro que voltássemos um dia só, sem termos sido convidadas a entrar numa casa para pregar, ou pelo menos para nos assentarmos à soleira da porta e falar a respeito do Senhor, que salva do pecado. Prova admirável do favor divino, nesta época, foi o fato de Deus ter dado a meu esposo, auxiliares na­ cionais. Para realizar o plano de trabalho, que adota­ mos, era preciso contar com uma boa equipe de evan­ gelistas fiéis. Uma ocasião após outra, pedimos ao Senhor, homens e mulheres para ajudar-nos, e a res­ posta nunca faltou. Visto que meu marido parecia ter bastante gente para ajudá-lo, muitas vezes era procurado para ceder evangelistas, tanto por colegas da mesma missão como por outras missões. A princípio, eu me opunha, não querendo que ele cedesse os melhores elementos, mas ele me respondia: “ O Senhor foi bom para comigo; posso então ser menos generoso para com os irmãos ?” E fato surpreendente: sempre que ele cedia um evan­ gelista muito valioso, logo depois surgia outro homem,

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ainda melhor. 0 segredo de como obtinha ele elemen­ tos, revela-se nas palavras de sua carta escrita a um amigo, no Canadá, mais ou menos na época de que falo: “ Chegamos a esta pequena cidade;mercado, em se­ tembro do ano passado. Minha esposa contava com duas obreiras. Eu tinha o Sr. Tung, o velho evange­ lista e um jovem de curso ginasial, o único cristão da­ quele distrito, sem preparo religioso ou experiência para a obra, mas com uma qualidade a seu favor, fôra convertido ou avivado pelo Espírito Santo no reavivamento de Changte, sendo sincero e esforçadíssimo. Depois de estarmos aqui, uns vinte dias, começaram a aparecer dezenas de pessoas para conversar. Entre essas, havia ladrões, viciados em ópio, e jogadores. O trabalho durava todo o dia e metade da noite. Está­ vamos ficando exaustos. Não tínhamos obreiros sufi­ cientes. Era como uma grande carga, que me forçou a ajoelhar. Disse eu ao Senhor que Ele era o Senhor da seara e precisava mandar mais ceifeiros. Houve um tempo de intensa espera em Deus, quase uma agonia, e então o pèso foi aliviado. Senti que Deus respondia. Disse à minha esposa que estava certo de que Deus nos mandaria mais obreiros. E agora, qual é o resultado? Desde então, Ele me enviou dois bacharéis chineses, ambos ótimos orado­ res. Também despertou um presbítero excelente, fa­ zendo com que o homem resolvesse deixar seus negócios e fosse nomeado evangelista. Nesta cidade, um estu­ dioso, que antigamente usava ópio e jogava, converteuse no ano passado. Fez um progresso impressionante,

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e tudo faz crer que ele ainda será um dos pregadores da vanguarda. Há também aqui, dois irmãos que foram dos primeiros convertidos do ano passado, os quais ajudam a pregar. O pai deles tornou-se cristão na mesma época, sendo quem sustenta os dois” . Outra prova graciosa Deus, vê-se na forma pela crianças, fomos guardados mam os chineses carregar toda parte, mesmo quando léstias contagiosas.

da providência soberana de qual nós, e especialmente as de contrair doenças. Costu­ as crianças nos braços por estão doentes e até com mo­

Lembro o seguinte caso para ilustrar como era impossível saber a que momento estaríamos sujeitos ao perigo. Fui a certa vila para um dia de pregação. Levei comigo a pequena Mary, que tinha então, três anos de idade. Uma senhora cristã serviu-nos com a maior gentileza e bondade, trazendo água e comida para Mary e para mim. Muito ocupada em pregar à mulher, não me ocorreu perguntar-lhe porque conser­ vava coberto o rosto do nenê, estando a criança sempre em seus braços. A o sair, perguntei-lhe. Descobriu o rosto do pequeno. Fiquei horrorizada ao ver que ele estava sofrendo de varíola! Durante muitas semanas prestei atenção à temperatura de Mary, mas não acon­ teceu nada. Através de repetidos exemplos desta natureza, co­ mecei a ver que o Sr. Goforth tinha razão ao dizer: “ O lugar mais seguro para você e as crianças é no ca­ minho do dever” . Quando me recordo daqueles anos de viagens evangelísticas com as crianças, faltam-me palavras

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para expressar toda a bondade do Senhor para com elas e comigo. Embora houvesse lugares verdadeira­ mente difíceis, eram nada mais do que oportunidades para Deus ofertar-nos graça e ajuda especial. Quantas vezes não me achei tão desanimada, a ponto de não querer mais viajar com as crianças! Entretanto, vinha uma prova de que Deus se utilizava de nossa vida fa­ miliar, vivida ali no meio dos chineses para ganhá-los para Cristo. Então eu tomava novo alento e tornava a sair. Pois, é verdade que: Deus fará tudo por nós, Podemos confiar plenamente. Pois, quem confia de vez, Conhece que Deus é presente.

VII A H ISTÓ R IA DE UMAS FÉ R IA S (1908-1910) Invoca-me no dia da angústia: Eu te livrarei, e tu Me glorificarás. — Salmo 50:15. No verão de 1908 fui obrigada a voltar ao Canadá com cinco de nossos filhos, deixando o Sr. Goforth na China para a obra de avivamento. Chegando a Toronto, soube que meu filho mais velho estava às portas da morte, devido a repetidos ataques de febre reumática. Acliava-se èle, na ocasião, a um dia de viagem de nós. A caminho do lugar, re­ cordando as vezes em que Deus no-lo havia devolvido das portas da morte, senti fortalecida minha fé, para crer novamente em seu restabelecimento. Porém, en­ quanto orava, percebi com clareza (pie a resposta a meu pedido, dependia de mim — eu precisava entre­ gar-me ao Senhor e submeter minha vontade a Ele. Planejara não me comprometer a dirigir trabalhos durante aquele período de licença, a fim de poder de­ dicar-me totalmente às crianças. Confessei meu pecado de querer planejar minha própria vida, e prometi ao Senhor que se Ele levantasse o meu filho para o Seu serviço, eu aceitaria reuniões ou faria qualquer coisa,

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à medida que Ele abrisse o caminho para o cuidado das crianças. Havia, entretanto, seis portas difíceis, que teriam de abrir-se — não uma só, mas todas — antes de eu sair e falar de Cristo pela China, como Deus parecia estar-me pedindo. Em primeiro lugar, o Senhor pre­ cisaria curar completamente meu filho, visto que eu não poderia encontrar justificativa para abandonar uma criança doente. Segundo, Deus teria de devol­ ver-me a saúde, pois que eu havia recebido ordens para me internar para uma operação. Terceiro, teria de conservar as outras crianças com saúde. Quarto, teria de mandar-me uma pessoa para trabalhar em casa — embora meu salário não me permitisse pagar emprega­ da, pois só com bastante economia, o dinheiro dava para as despesas. Quinto, alguma senhora crente pre­ cisava dispor-se a cuidar das crianças e encarregar-se da casa, em minha ausência. Sexto, era necessário di­ nheiro suficiente para fazer face aos gastos extraordi­ nários, advindos de minha saída de casa. No entanto, quando expus tudo isto perante o Senhor, recebi a segurança de que Ele abriria o cami­ nho. Meu filho foi trazido de volta a Toronto, deitado numa maca, sob ordens médicas de nem sequer erguer a cabeça. A o chegar, porém, recusava-se a obedecer, dizendo que se sentia tão bem, que não podia, nem queria mais ficar imóvel. Temendo as consequências desta sua atitude, telefonei ao médico para vir sem de­ mora. Chegando, fêz um exame completo no jovem pa­

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ciente e disse: “ Não entendo. Só posso dizer-lhe que o deixe à vontade” . Em um mês, o menino estava novamente assistin­ do às aulas no ginásio, aparentemente com boa saúde. Alguns meses depois, candidatou-se. ao cargo de guar­ da florestal do govêrno. Teve de passar pelas mãos do médico oficial. Meu filho contou-lhe o que tinha sofri­ do e o que o médico lhe dissera a respeito do coração. O médico replicou: “ Apesar do que V . me contou, não descubro nada de anormal, e portanto, posso dar-lhe o atestado de boa saúde” . Com relação a mim mesma, não fui para o hospi­ tal, pois desapareceram todos os sintomas que pare­ ciam indicar uma operação, tendo ficado completa­ mente restabelecida. Encontrei uma empregada, que fazia alegremente o serviço, cooperando comigo no Senhor. Uma sobrinha casada, que morava perto, ofe­ receu-se para ficar em casa quando eu precisasse estar fo ra . Faltava assim, apenas uma condição a ser preen­ chida — era o dinheiro. Mas, eu confiava que éste viria, à medida, que eu prosseguisse; e veio mesmo. Cada mês, quando eu fazia o balancete, verificava que a receita ultrapassava a despesa, havendo ainda sufi­ ciente dinheiro para o trabalho na China e para comprar coisas, que eu precisaria levar, inclusive um órgão. Todas as contas foram apresentadas ao nosso estimado secretário da Junta de Missões, que as aprovou. Em tais circunstâncias, não podia eu recusar con­ vites para falar em público. Entretanto, tão fraca era

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rainha fé que durante meses não saí de casa sem temer que acontecesse alguma coisa às crianças, em minha ausência. Cheguei a aceitar convites sob a condição de que se as crianças precisassem de mim eu não po­ dería atender o compromisso. Mas, quando os dias, as semanas e os meses se passaram, e tudo correu hem, aprendi a confiar. “ Calma. Sê forte hoje” . Mas, amanhã, Senhor? Como será o amanhã? Repousaremos da luta, Teremos trégua da dor? “ Por ti eu não morri? Por ti eu não vivi? Deixa comigo o amanhã” . Ao apresentar o que se segue, desejo esclarecer que se eu estivesse vivendo uma vida de lazer ou co­ modismo, não seria justificável esperar que Deus se ocupasse em agir por mim em assuntos que aqui rela­ to. É necessário lembrar que eu passara a viver uma existência, que significava receber tudo pela fé . Antes de sair da China, rumo ao Canadá, disseme meu esposo: “ Não limite o número de maçãs para as crianças; dê-lhes quantas quiserem” . Mas, quando comecei a administrar a casa, descobri que não era tão fácil fazer isto. As maçãs estavam caras e o apetite dos seis filhos pela fruta era insaciável. Contudo, co­ mecei comprando uns cestos pequenos, e depois não precisei comprá-los mais, porque as maçãs foram apa­ recendo de modo maravilhoso. Primeiro, em cestas;

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depois, à medida que a estação avançava, em barris. Vieram de muitas fontes diversas; e em alguns casos de longas distâncias, com porte pago até a porta. Certa vez, um barril de maçãs grandes, firmes, de côr verde, chegou justamente quando terminamos o último barril de outras. As crianças reclamaram que estas eràm duras demais para comer, e rogaram que eu lhes com­ prasse umas maçãs “ Neves” — bastante caras, porém deliciosas! Só comprei um cesto pequeno. De um amigo distante veio uma remessa grande, quase um barril. Tenho para mim que o Senhor reconheceu ter eu deixado tudo por Ele, e por isso quis mesmo mostrar Sua providência, revelando assim Seu cuidado e amor para com meus queridos filhinhos. Tínhamos estabele­ cido residência, no fim da estação das frutas por isso não pude fazer conservas para usar no inverno. Na­ quele fim de ano, porém, muitas vezes fomos presen­ teados com frutas em conserva, até por pessoas desco­ nhecidas. Recebemos um total de setenta vidros das mais finas frutas. Quero relatar os pormenores de um destes presentes. Pouco antes de sair de casa para ficar fora dez dias, a empregada avisou-me de que não havia mais frutas em conserva. Conseqüentemente, desci e fiz um pedido de frutas sêcas, que dessem até a minha volta. Chegando a casa, as crianças receberam-me à porta, em alvoroço, todas elas querendo falar ao mesmo tempo, a fim de contar que chegara um lindo presente de São Valentim. (* ) Conduziram-me à cozinha. Mostraram-

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me a mesa coberta com vinte potes de frutas apetitosàs, e uma grande lata de melado, feito da seiva de bordo, tudo uma delícia. No cartão que acompanhava o pre­ sente, vinha escrito: “ Um presente de Sao Valentim* para nossa querida substituta na China, das irmãs Renfrew” . No começo do inverno, tornou-se evidente que um telefone era uma necessidade, à vista dos muitos com­ promissos e chamadòs que eu recebia. Hesitei em fazer esta despesa, por não saber se seria direito usar para isso, o dinheiro que eu recebia. Finalmente, orei ao Senhor para mostrar-me Sua vontade no assunto, man­ dando-me metade do preço do telefone, dentro de certo prazo, se fôsse para eu adquiri-lo. Antes de passar o prazo, veio o dinheiro e obtive o telefone. Chegando o tempo frio comecei a padecer, nas longas viagens no campo, a fim de fazer palestras. Senti o desejo de possuir um casaco de pele. Consul­ tei o secretário da missão para saber se, caso eu rece­ besse dinheiro suficiente, poderia comprar um casaco de pele. A resposta foi um decidido “ sim” . Não res­ tava dúvida de que o casaco era uma necessidade no trabalho do Senhor. Comecei a orar, então, pedindo que o Senhor enviasse depressa o dinheiro, pois o frio era intenso. Em menos de duas semanas recebi a im­ portância necessária, e naturalmente, comprei o casaco. As senhoras da Federação Presbiterial de Winnipeg organizaram uma série de conferências para * Dia de S. Valentim — 14 de fevereiro — é o “Dia dos Namorados”, lá.

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mim em Winnipeg, Brandon e outros lugares, naque­ la região, uns dez ao todo. As coletas das reuniões de­ veríam cobrir minhas despesas de viagem, que monta­ riam em mais de cem dólares. Viajando de trem, de Toronto a Winnipeg, apanhei um forte resfriado, que me atacou a garganta e o peito. Não queria desapon­ tar aquelas senhoras, nem dar-lhes tanta despesa, dei­ xando de realizar o trabalho. Pouco antes de chegar a Winnipeg pude entregar-me definidamente nas mãos do Senhor, a fim de receber forças e a voz necessárias às reuniões. Os dias seguintes foram inesquecíveis porque a fraqueza física, a febre, o mal da garganta só foram removidos enquanto eu fazia as preleções. Cada vez, embora antes e depois de minha fala eu es­ tivesse rouca a ponto de não me poder fazer ouvir a não ser num cochicho, minha voz se desembargava para a predica. Por exemplo: estava hospedada em casa do D r . C. W . Gordon e Sra., no domingo em que deveria falar em sua igreja. À mesa do jantar, perguntei ao D r. Gordon se ele estaria pronto a substituir-me, caso eu falhasse. Logo antes de chegar a minha vez, subi à plataforma, por trás do Dr. Gordon, que estava orando. E como eu orei, implorando ajuda e coragem! A igreja estava repleta, até as dependências do salão da Escola Dominical foram abertas para acomodar o povo. Minha garganta estava como que apertada por um torno, e eu me senti fraca e doente. Contudo, quando o Dr. Gordon apresentou-me, tomei meu lugar, possuída de uma calma e confiança, absolutamente maravilhosas. Parecia-me sentir a presença de TTm como o Pilho do

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homem. Nunca senti tanto como sendo eu apenas o canal pelo qual Deus agia. Falei mais de uma hora, de modo que todos puderam ouvir-me distintamente. mas, quando me sentei, a garganta apertou de novo como antes, D r. Gordon contou-me depois que pedira a um homem para sentar-se no lugar, onde era mais difícil ouvir, e ele pôde ouvir to*das as palavras. Assim foi até o fim de meus compromissos. Na viagem de volta para casa, pedi ao Senhor que Êle curasse minha garganta ou me desse um meio de des­ cansar de falar em público, pois eu tinha muitos com­ promissos à minha espera, em Ontário. Uns dias depois de chegar a casa, quatro de meu filhos adoeceram com sarampo. Durante as semanas de isolamento com eles, minha garganta recebeu o descanso de que precisava c sarou. Um dia, no comêço do verão seguinte, examinan­ do as roupas das crianças, descobri que havia tanto o que fazer, que desanimei. Y i ser impossível costurar tudo e também fazer as palestras, já marcadas. A per­ gunta, que me pesava, era esta: “ Devia eu cancelar as reuniões para as quais tinha empenhado a palavra?” Meu esposo aconselhou-me a comprar roupas feitas, mas eu sabia como eram caras, não me permitindo a consciência, comprá-las. Fui sozinha orar e apresentei ao Senhor o problema, pedindo-Lhe que se Sua vontade era que eu continuasse a falar em favor da China, Ele me revelassei isto, enviando-me algum presente, que tornasse possível comprar roupas feitas para as crian­ ças. Poucos dias depois, falei numa reunião de uma Federação Presbiterial no Oeste de Ontário. No final

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da reunião da noite, um senhor de idade pôs em minhas mãos algum dinheiro. Perguntei-lhe como queria que eu o empregasse, e èle me respondeu: “ Para seus filhos. TJse-o de um modo que fique mais livre para o trabalho de Deus” . Meu coração ergueu-se numa prece de gratidão, e resolvi aceitar isto como o sinal que eu pedira ao Senhor. Voltando a Toronto, gastei este presente na compra de roupas feitas para as cri­ anças, a fim de conservar meu tempo e energia para a obra do Senhor. Enquanto trabalhava em casa, certo dia, a lem­ brança de duas amigas queridas da Missão do Interior da China vinha-me sempre à mente, e comecei a pensar se não devia enviar-lhes algum dinheiro. Olhei a bôlsa, e vi que só continha cinqiienta centavos. Resolvi es­ quecer o assunto, com a idéia de que se o Senhor quisesse que eu enviasse alguma coisa a elas, Èle haveria de mostrar como fazê-lo. Na correspondência recebida naquela tarde, veio uma carta de um ponto longínquo de Ontário, onde há um ano atrás,' eu fizera uma visita e dirigira a palavra, a convite de uma pessoa amiga. A carta vinha do tesoureiro do Esforço Cristão, a so­ ciedade à qual eu falara. Vinham em anexo, cinco dóla­ res, e a carta dizia que o dinheiro era para ter sido dado na ocasião da conferência, mas por descuido não fôra entregue antes. Pensei primeiro em devolvê-lo, visto que fizera aquela viagem por amizade; depois lembrei-me das amigas para as quais queria o dinheiro, e resolvi man­ dar-lhes os cinco dólares. Meu esposo, ao voltar na

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manhã seguinte, deu-me mais cinco para juntar aos ontros, e remetemos os dez dólares. Passou tempo, veio a resposta daquelas amigas, dizendo que na manhã em que minha carta chegou, ambas haviam tido a certeza de que viria uma impor­ tância pela qual estavam orando. Era para atender a uma necessidade, que elas não queriam apresentar à sua jünta missionária. Minha carta com os dez dólares e mais outra chegada à tarde, no mesmo dia, continha um presente, que somado ao meu, deu exatamente a quantia, que pediam ao Senhor. Não digas ó minha alma: “ Deus poderá me dar?” Recorda que o Onipotente tem servos em todo lu gar! Certa vez, quando eu estava para sair de casa, numa viagem de dez dias a Montreal e outros lugares, chegou a notícia de que havería uma festa na Escola Dominical, durante a minha ausência. A pequena Mary não tinha um vestido “ melhor” para a ocasião. Eu ia fazer um vestido de lã, brauco, para ela, mas agora o tempo não dava. Sabia não ser possível eu fazer o vestido enquanto estava fora, com tantas reuniões marcadas. Entretanto, naquele mesmo dia, uma senhora de nossa igreja veio visitar-me. Disse que fazia tempo que queria ajudar-me, e perguntou-me se poderia fazer alguma costura para mim. Com os olhos marejados e o coração agradecido, aceitei o ofe­ recimento. Ao voltar da viagem, Mary contou-me do bonito vestido branco, que usou para a festa da Escola Dominical.

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Mais uma vez planejamos sair do Canadá e voltar à China. Porém, apresentava-se um problema sério. O filho mais velho podia ficar para enfrentar a vida sozinho, mas a filha de dezesseis anos, não. Era pre­ ciso achar uma pessoa idônea para assumir a tutela da menina. Avistei-me com três, que achei que pudessem sentir responsabilidade para com a filha dos missio­ nários, mas todas as três declinaram da tarefa. Vi então que não era para eu tentar abrir portas, mas que neste caso também, precisava eu confiar o problema a Deus. Orei pedindo que se Ele desejasse meu regres­ so à China, mandasse alguém com quem eu pudesse deixar minha filha. Pouco tempo passou-se, e apareceu em casa uma senhora, cuja vida fôra dedicada à orientação e edu­ cação das jovens. Sua bela personalidade cristã a in­ dicava, acima de todas, como aquela a quem melhor eu poderia confiar minha filha. Contou-me esta senhora, que em môça, desejou dar sua vida à obra na China, mas o caminho não se abriu. Sentia agora que o Senhor queria que ela se oferecesse para tomar conta de minha filha. Paz anos que isto ocorreu, e ela satisfez as mais altas expectativas. Raramente terá vindo de um Pai amoroso, resposta mais pronta, ou que trouxesse mais alívio e ajuda; porque o oferecimento, vindo assim, ■atendendo à minha prece, pareceu-me provar clarafmente que o Senhor iria guardar minha filha agora', quando eu precisava cedê-la. Chegava a hora de iniciarmos os últimos prepa­ rativos para a longa viagem à China, quando um dia, Rute entrou em casa com seu casaco de frio, quase em

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farrapos. Estava brincando, e não se sabe como, rasgou-ó todo numa cêrca de arame farpado. O casaco era o único agasalho grosso, que ela possuía. Eu tinha resolvido que o mesmo serviria para a viagem de navio, e na Inglaterra compraria outro novo. Tentei achar um nas lojas, mas sendo fora de estação, não encontrei. Não havia tempo para fazer um. Só pude levar ao Senhor esta necessidade e confiar que Ele acharia a maneira de resolver a situação. Uns dias mais tarde, uma amiga telefonou, dizendo que a mãe desejava que eu fôsse ver um embrulho, que trouxe para mim. Ah, que alívio senti quando verifiquei que o pacote conti­ nha, entre outras coisas, um elegante casaco vermelho, que servia direitinho para Rute. Esta nova mostra do cuidado soberano de Deus, tocou-me profundamente. Quem desconhece estes sinais do cuidado amável do Senhor nas pequeninas coisas de nossa vida, dificil­ mente compreenderá a benção, que,trazem tais expe­ riências. Seja um pêso tão enorme que ninguém suporte vêdo, Seja um fardo tão pequeno que ninguém possa mantê-lo, O pequeno ou grande fardo eu entrego ao Mestre amado E ambos tornam-se suaves quando me acho a Seu lado. Procuro relembrar as respostas à oração deste pe­ ríodo passado em minha pátria. Tantas me vêm à mente, que é impossível registrar todas: ajuda para atender aos- compromissos, coragem e autoridade nas

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conferências realizadas, forças físicas e direção ao en­ frentar muitos problemas de solução difícil. Poi nesta época, que formei o hábito de procurar de joelhos a mensagem, que deveria apresentar numa palestra. Muitas vezes, parecia-me maravilhoso o modo pelo qual, como que num lampejo, vinha-me á idéia, um esboço para uma fala sobre a China. Jamais guardei apontamentos, ou mesmo esboço de palestras, portanto, encontrei-me com freqüêneia em circunstâncias em que sentia depender somente do Senhor. E quero testifi­ car que Éle nunca deixou de dar-me o auxílio preciso e o reconhecimento do poder divino. Contudo, como é triste, triste mesmo, lembrar que, muitas vezes, em horas justamente como estas, logo que a predica esta­ va terminada, vinha o pensamento fomentado por Sa­ tanás: “ Fiz bem h oje” . Oh, quão admirável é a bondade e o longanimidade de nosso Deus, que se dispõe a ajudar-nos mesmo depois disto, quando nós Lhe pedimos. Há pouco tempo, perguntei a uma querida amiga, cujos escritos alcançam e inspiram multidões, através do mundo cristão: “ Como você o fêz?” Suavemente, com profunda reverência no olhar o no tom de voz, respondeu-me ela: “ Poi tudo feito em oração e por intermédio da oração” ., Com gratidão imensa e louvor ao Deus sempre fiel, também eu testifico que qualquer pequeno serviço, que pude prestar, foi devido à Sua graça, em resposta à oração.

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Maravilhado, murmurei: “ Será Que Ele me concedeu o que pedi? Quão admirável o que eu recebi!” * •

Incréu! Ele não promete atender? Cumprir Sua palavra? Por que então temer? Seria de admirar se Ele falhasse, Se de êxito tua prece não coroasse!

VIII NOSSO DELIS, O DEUS DO IM POSSÍVEL Eis que Eu sou o Senhor. . . acaso ha veria coisa demasiadamente maravilhosa para Mim? — Je­ remias 32:27. Ah! Senhor Deus! coisa alguma Te é demasiada­ mente maravilhosa. — Jeremias 32:27. Foi enquanto assistíamos ao Congresso de Kesvvick, na Inglaterra, em 1910, que se deu a seguinte ilustração desta verdade: “ O que é impossível ao ho­ mem é possível para Deus” . Certa noite, meu esposo voltou de uma reunião, à qual eu não assisti, contando-me de uma mulher que o procurou, muito aflita. Havia sido uma sincera obreira cristã, mas se deixara tomar de uma paixão pela ficção frívola e leviana, que se apoderou dela de tal forma, que arruinou sua vida cristã. Três anos em seguida, vinha ela a Keswick em busca da vitória al­ mejada, mas em vão. Comoveu-me o problema da pobre mulher. Eu queria muito ajudá-la. Mas, o Sr. Goforth não sabia o nome dela, não podendo reconhecê-la novamente,, se a visse, pois que a tenda estava escura, e além disto,

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havia umas quatro mil pessoas assistindo ao Congres­ so. Naquela noite fiquei acordada, pedindo ao Senhor que se Ele achasse que eu poderia ajudá-la, fazer com que nos encontrássemos, porque eu também quase fôra a pique no mesmo rochedo. Três noites depois, a tenda estava tão cheia que foi difícil achar lugar para sentar-me. Quando a reu­ nião estava para começar, notei uma mulher que mudou de lugar duas vezes, levantou-se e veio até onde eu estava, pedindo-me que lhe desse um lugarzinho. Apertei para o canto e arrumei lugar — talvez não com tanta boa-vontade como era preciso. Enquanto o Sr. F . B . Ideyer falava, reparei que ela se achava angustiada, as lágrimas caindo copiosamente. Pus minha mão sobre a dela. Agarrou-me a mão, convul­ sivamente. Terminada, a reunião, perguntei-lhe: “ Posso ajudá-la?” . “ Ai, não” , respondeu. “ Não há esperança para mim; são aqueles malditos romances, que me estra­ gam” . Olhei-a, pasmada, e disse-lhe, ofegante: “ Foi a se­ nhora que falou com o Sr. Goforth iio sábado, à noite?” “ Fui sim; mas a senhora, quem é?" Com a voz embargada de emoção, disse-lhe quem era, e contei-lhe sobre minha oração. Durante uns mo­ mentos, só pudemos chorar juntas. Depois o Senhor usou-me para guiar aquela pobre alma oprimida, a voltar-se a Ele. Quando nos despedimos, uns dias de­

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pois, o rosto daquela mulher reluzia com o gôzo do Senhor. Falando a um grupo de cristãos de Glasgow, apre­ sentei certo incidente, que para ter graça, dependia de uma estrofe de um hino. No momento de citá-la, fu ­ giu-me completamente da memória. Um pouco confusa, voltei-me para o dirigente, esperando que me viesse em socorro, mas ele não tinha idéia de que hino seria. Dirigi-me à congregação novamente, desculpando-me por que a memória falhara, e sentindoune embaraçada, abreviei o término da mensagem. Sentei-me e ergui meu coração numa prece ao Senhor, rogando que me guiasse aos versos que eu queria citar, se estivessem no hinário usado ali. Tomei do hinário e abri-o. As primeiras palavras que meus olhos viram foram as da estrofe que eu buscava, em­ bora fôsse a última de um hino bem longo. Levanteime outra vez para contar ao auditório a minha oração, a resposta, e li a estrofe. O solene silêncio que se seguiu, indicava a profunda impressão causada. Uns dois anos mais tarde, um missionário recémchegado à China, contou-me que assistira àquela reu­ nião, tendo sido aquele pequeno incidente uma grande bênção para ele. “ A Ti clamaram, e se livraram; confiaram em Ti Ti e não foram confundidos” . — Salmo 22:5. Antes de sair do Canadá, escrevemos à Escola do Interior da China em Chefoo, com esperança de ma­ tricular as crianças ali; mas, pouco antes de deixar a

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Inglaterra com destino ao Oriente, recebemos a notí­ cia de que tanto a escola masculina como a feminina estavam com excesso de alunos, tendo grandes filas à espera. Foi um grande desapontamento para mim, porque eu estava esperando poder entrar mais uma vez no trabalbo agressivo de evangelização das áreas re­ motas . Entretanto, não era possível abandonar as crian­ ças, e elas já não estavam na idade de não precisar estudar. Era necessário, pois, achar uma boa gover­ nanta, crente em Deus, que ensinasse as crianças e cuidasse da casa em minha ausência. Durante toda a viagem através da Sibéria, o assunto estava diante de nós. Orei fervorosamente para que o Senhor nos apre­ sentasse a pessoa certa; pois, reconhecia que era difí­ cil obter na China uma senhorita que fôsse capaz de fazer o que desejávamos. Nosso plano era dirigir-nos diretamente ao nosso posto, mas, por doença, fomos forçados a interromper a viagem em Peitaiho, onde ficamos conhecendo uma jovem, filha de missionários. Surgiram vários obs­ táculos a que ela viesse conosco, mas um a um foram removidos. Quando seguimos viagem, esta môça fazia parte de nosso gtupo. Com o passar do tempo, compreendemos melhor ainda que ela nos foi mandada por Deus. Era capaz para tudo o que esperávamos e mais. E o Senhor atendeu as minhas orações para que aquela vida jovem fôsse consagrada ao Seu serviço, na China. Mais tarde, ela veio a estudar, preparando-se na Inglaterra como enfermeira, e depois voltou à China como missionária.

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As férias de verão em Peitaiho estavam terminan­ do. Cairam chuvas pesadas, fazendo com que as estra­ das que levavam à estação, ficassem intransitáveis. A estação ficava a uma distância de seis quilômetros. Recebemos aviso de que nossos filhos, Rute e Wallace, precisavam sair no trem da manhã, da segunda-feira seguinte, a fim de alcançarem o vapor em Tientsin, o qual os levaria a Chefoo, onde frequentavam as esco­ las da Missão. No sábado e domingo, cairam chuvas torrenciais, ininterruptamente, além do que soprava um vento norte, feroz. Ao acordar na madrugada de segunda-feira, vi que ainda chovia a cântaros. Despertei o criado e man­ dei-o verificar a liteira, a carroça e os burros. Ele voltou logo, dizendo que a liteira fôra entornada pelo vento e os carregadores negavam-se a vir. Os carro­ ceiros também se recusaram, alegando que não se podia transitar pelas estradas; e nem mesmo os rapazinhos, que dirigiam os burros de carga, queriam sair com um tempo como aquele. Vi-me num impasse. Fui orar sozinha, e nem tomei tempo para ajoelhar-me. Apenas ergui meu co­ ração ao Pai, a fim de que Èle fizesse parar a chuva, tomando possível às crianças chegarem à estação. E de repente senti a confiança segura de que o Senhor nos ajudaria. Saí novamente e mandei o servo correr depressa à vila, procurar outros burrinhos. Éle não quis ir, alegando ser inútil, que ninguém viria; mas, eu lhe disse: “ Vá logo, pois eu sei que virão” . Enquanto ele saiu, servi o café às crianças, e as malas foram fechadas e levadas para fora. Os filhos

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vestiram os agasalhos. B então, a chuva parou! Na­ quela hora voltou o empregado com alguns animais. Dentro de cinco minutos, as crianças e a bagagem es­ tavam no lombo dos burros, e a caminho da estação. Poucas horas depois, um dos burriqueiros voltou com um bilhete escrito às pressas por Rute, avisando que tinham chegado bem à estação, sem se molharem; pois no caminho não havia chovido, porém, a chuva come­ çou a cair dè novo logo que subiram no trem. Choveu ainda por muitos dias. Ao fim de nossos quatro meses de conferências na Grã Bretanha, em 1910, senti um desejo forte de mandar um presente de cinco libras a cinco obras evangélicas inglêsas, demonstrando de maneira práti­ ca a nossa solidariedade com os obreiros dos vários ramos da causa do Senhor. Meu esposo estava fazendo as contas quando me dirigi a ele, pedindo-lhe cinco libras para este fim . Disse-me ser impossível, visto que mal tínhamos o su­ ficiente para a viagem à China. Saí, pensando porque teria eu sentido assim aquela vontade, o dever imposto sobre mim, de mandar este dinheiro, quando não o possuía. Arrazoei que se a ordem fosse mesmo do Senhor, Ele mesmo poderia dar-me os recursos, e deixei o assunto de lado. Na correspondência daquela tarde, recebi carta de pessoa desconhecida, que morava bastante longe dali, a .julgar pelo carimbo, pois a earta não trazia o ende­ reço do remetente nem a assinatura. Dizia o seguinte: “ Não os conheço, nunca lhes fui apresentado, mas o Senhor parece ter colocado em meu coração o dever de

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mandar-lhe esta nota de cinco libras como presente de despedida. Façam o que acharem melhor com ela” . Foi com alegria no coração, que mandei os presen­ tes aos cinco obreiros cristãos ingleses. Se o doador houvesse dito que era “ para o trabalho na China” , como sempre acontecia, não poderia ter usado o dinheiro para outra finalidade. Como conseguir costurar as roupas para a famí­ lia, e ainda atender aos inúmeros e urgentes compromis­ sos de esposa de missionário pioneiro, tem sido talvez o mais difícil e constante problema de minha vida mis­ sionária. Ligadas à solução deste problema, tenho visto algumas das provas mais preciosas do que Deus se dispõe a agir nos pormenores de nossa existência coti­ diana. O caso seguinte precisa ser relatado para ser com­ preendido, porque se constitui num exemplo extraordi­ nário de como Deus, de maneira singularmente Sua, pode dar solução àquilo que parece impossível ser so­ lucionado . Eegressando de uma viagem evangelística, excepeionalmente árdua, no outono, planejei como sempre, reservar o mês de dezembro para as costuras das crian­ ças, a fim de em janeiro estar mais livre para um curso de treinamento de evangelistas. Mas, minha saúde esta­ va abalada, e quase não rendia o meu esforço para dar andamento às trinta e cinco ou quarenta peças, que era preciso fazer ou reformar antes de as crianças voltarem às aulas em Chefoo. Até o dia 18 de dezembro, já tínha­ mos resolvido cancelar o cursinho por causa de meu es­

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tado de saúde. Mandamos avisar todas as senhoras, com exceção de uma, de quem me esqueci completamente. Com o passar dos dias, mais e mais me pesavam aquelas costuras, que eu não fazia! Pinalmente roguei ao Senhor que atuasse por mim. E que maravilha não foi a Sua resposta! No dia 28 de dezembro, quando eu dirigia um culto de oração para as mulheres, notei que estava presente a Sra. Lu, aquela que eu me esquecera de avisar. Vinha de longe, com o nenê, por caminhos ásperos e íngremes, e por isso muito me arrependí de meu descuido. A Sra. Lu acompanhou-me até a minha casa. Dei-lhe dinheiro para pagar um carrinho de mão, que a levasse de volta no dia seguinte. Depois, sentei-me à máquina de costura. A mulher ficou de pé, observan­ do-me por alguns minutos e disse: “ A senhora parece estar cansada, Sra. Goforth deixe-me costurar para a senhora” . “ A senhora!” exclamei, muito admirada. “ Ora, a senhora sabei” “ Sei, sim” , respondeu-me. Insistiu tanto que, finalmente, com mêdo e relutân­ cia, resolvi deixá-la experimentar — é que eu tinha so­ mente uma agulha. Em poucos minutos, ela me conven­ ceu de que era mesmo perita no manejo da máquina. Quando insisti com ela para ficar e ajudar-me, respon­ deu-me que, não havendo mais as aulas, iria voltar para casa no dia seguinte. Naquela noite fiquei perplexa. Por que o Senhor me teria mandado esta mulher — a única de nosso co-

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nheeimento que sabia trabalhar com a máquina, e depois deixaria que ela fôsse embora? Só pude expor isso di­ ante do Senhor, confiando na Sua ação. E outra vez, tíle atendeu-me. À noite, desabou um temporal, que durou vários dias, tomando as estradas intransitáveis. A Sra. Lu, prêsa pela tempestade, devotou-me todo o seu tempo, com a maior boa-vontade. As estradas con­ tinuaram fechadas durante um mês inteiro, e nesse tempo não tive de sentar-me diante da máquina uma só vez. Enquanto estava em Tientsin com as crianças, du­ rante a revolução de 1912, tive ocasião de entrar na ci­ dade chinesa com meu servo. Visitamos três lojas. No caminho para casa, no bonde, descobri que tinha perdi­ do uma nota de cinco dólares e uma de minhas luvas. Tivera a imprudência de pôr a nota dentro da luva. Fiquei com vergonha de que o servo chinês soubesse da minha falta de cuidado. A o chegarmos ao ponto final do bonde, mandei-o para casa. Tão logo ele desapare­ ceu, tomei o bonde de volta à cidade. No caminho con­ fessei ao Senhor o meu descuido. Pedi a Êle que guar­ dasse a luva e o dinheiro, dirigindo-me para onde esta­ vam. Voltei pelo mesmo caminho, a duas das lojas onde havia estado. Ao entrar na segunda, que era de calça­ dos, havia alguns homens na loja. À vista de todos, jazia no chão a minha luva, e eu sabia que os cinco dólares estavam dentro, naturalmente. Foi com o coração mui­ to agradecido ao bondoso Pai Celestial, e com maior com­ preensão de Seu amor, que apanhei a luva e fui para casa naquele d ia .

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Uma vez que fui ao Canadá com alguns de meus filhinhos, tendo meu esposo ficado na China, não tive residência fixa. A o chegar a época de fazer roupas para a longa viagem de regresso à China, não me era possível costurar. Eu tinha de aguardar de Deus a solução; e como tantas vezes já acontecera, Ele foi fiel e abriu um caminho. Certo dia, estava eu fazendo compras na ci­ dade, quando me encontrei com a esposa de um pastor de uma igreja rural distante. Disse-me ela: “ Quero que a senhora venha à minha casa com todos os seus filhos, pára fazer as costuras. Há diversas senhoras em nossa congregação, que costuram muito bem, e terão prazer cm ajudá-la” . Aceitei o convite com gratidão, e enquanto estava hospedada com ela, as senhoras da igreja promoveram um encontro com a finalidade de me ajudarem a costu­ rar. Em uma semana, ficou pronto o que me levaria muitas semanas de árduo e constante labor se estivesse sozinha. No inverno que se seguiu à nossa chegada da China, depois do trágico episódio com os “ Boxers” , senti im­ periosa necessidade de ter uma boa máquina de costu­ ra. Pois, não era possível costurar à mão para as cri­ anças, e ainda ter tempo de dirigir reuniões. Um dia, quando meu marido estava de saída para uma cruzada, pedi-lhe dinheiro para comprar uma máquina. Asse­ verou-me ser impossível. Só tínhamos o suficiente para cobrir nossos gastos essenciais. Eu sabia que ele me daria o dinheiro de bom grado, se o tivesse. Apresen­ tei, então, ao Pai Celeste a necessidade, confiando em Sua compreensão, e que segundo Suas promessas Ele a poderia dar-me.

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Tive tanta certeza de que o dinheiro, aparecería, que fui à cidade especialmente para escolher a minha má­ quina. Verifiquei que a mesma custaria uns trinta e seis dólares. Alguns dias depois, recebi uma carta de um grupo de senhoras em Mont Forest, no Ontário, en­ viando vinte e três dólares e alguns centavos, com os dizeres: “ Pedimos-lhe que aceite a quantia anexa para comprar alguma coisa que a senhora, como nossa subs­ tituta na China, teve a infelicidade de perder” . Um ou dois dias depois, veio outra carta de outra parte de On­ tário, contendo doze dólares e alguns centavos. As duas importâncias perfaziam o total exato da compra. A segunda carta dizia ainda que o dinheiro era en­ viado para ajudar-me a comprar uma máquina de cos­ tura. Sempre foi para mim um enigma saber como che­ garam a mandar o dinheiro com esta indicação, pois, eu não revelara a ninguém, a não ser a meu marido, o de­ sejo de adquirir aquela máquina. Quando o Sr. Goforth’ voltou, pude mostrar-lhe o que o Senhor pôde dar-me, quando ele não podia fazê-lo. Estava eu dando umas aulas às senhoras, num ponto de pregação afastado, hospedando-me em casa do pres­ bítero, D r. Fan. Um dia, antes de voltar para a casa, a Sra. Fan pediu-me para acompanhá-la numa visita a um menino, que estava muito doente. Fôra mandado da escola W ei Uivei para casa, pelo médico missionário, porque estava com tuberculose pulmonar. Disse-me a Sra. Fan, que a mãe estava muito aflita, e implorou que eu viesse orar com ela. Encontrei o rapazinho numa condição de causar dó. A bôca inchada, o rosto desco­ rado, e a tosse a sacudi-lo a cada momento. Parecia-me

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não oferecer mais esperanças, estando com os dias con­ tados. De regresso à casa da Sra. Fan, a mensagem de Tiago 5 :14,15 vinha-me à mente com insistência, como se uma voz a proferisse: “ Está alguém entre vós doen­ te? Chame os presbíteros da igreja, e estes façam oração sobre e le .. . e a oração de fé salvará o doente, e o Senhor o levantará” . Era-me impossível fugir daquelas palavras. Che­ gando à casa do D r. Fan, mandei chamá-lo e lhe per­ guntei se ele e os outros presbíteros .estavam dispostos a orar comigo pelo menino. Consentiu, embora a princípio, parecesse duvidar, lteuniu-se um bom núme­ ro de cristãos quando colocamos o rapazinho no meio de nós. Todos se ajoelharam, e eu li as palavras de Tiago. Expliquei bem que eu não podia dizer que era da vontade de Deus curar o menino; só sabia que pre­ cisavamos obedecer até onde tínhamos luz, deixando o resto nas mãos de Deus para a vida ou para a morte. Várias pessoas oraram e separamo-nos. No dia seguinte pela manhã, regressei a minha casa. Os acontecimentos não me permitiram voltar àquele lugar, e com o passar do tempo, mudaino-nos para outro campo. Mais de dois anos depois, em visita a Wei Urrei, encontrei-me com a Sra. Fan. Contou-me ela que o rapaz sarou completamente e estava agora trabalhando com o pai. Cm ano mais tarde, encontrei-me com o D r. Fan, e perguntando-lhe pelo rapaz, soube que estava perfeitamente são e negociava na cidade de \Vei Ihvei.

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0 poder da intercessão mostra-se nos dois inciden­ tes seguintes: No inverno de 1905, meu esposo recebeu um cha­ mado para dirigir trabalhos especiais na Mandchúria. Quando chegou a Liao Yang para as reuniões, um dos missionários mostrou-lhe uma carta escrita pelo Sr. Moffat, da Coréia, que dizia: “ Tenho aqui mil cristãos, que promete: ain orar pelo S r . Gof orth, e sei que suas orações prevalecerão diante de Deus” . Seria lícito du­ vidar que essas orações tivessem operado em relação ao maravilhoso movimento avivalista, que se seguiu? Quando meu esposo esteve na Inglaterra, em 1909, foi hóspede de uma senhora londrina conhecida pelo seu poder intercessório. Contou ele sobre os grandes avivamentos a que assistira, que se realizaram em várias pro­ víncias da China. Pediu-lhe ela que lesse em seu diário, as ocasiões em que ela se sentira especialmente dirigida a orar em favor do Sr. Goforth. As datas correspon­ diam exatamente com as de maior poder avivalista. Estávamos há alguns meses na China, depois de uma licença, quando convidei certo missionário com a esposa e filhos a nos fazerem uma visita. Fui movida a isso por circunstâncias singularmente comovedoras. O casal estava com a saúde abalada, precisando muito de uma mudança de ambiente. Moravam numa cidade bem no interior, isolados de contacto com outros missioná­ rios. Não pertenciam a uma sociedade ou junta, espe­ ravam somente em Deus para o seu sustento. Justamen­ te quando esses amigos saíram de sua casa para vir à nossa, irrompeu um surto de varíola em nossa missão,

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vindo a falecer um de nossos missionários. Mandamos um telegrama ao casal, esperando alcançá-los antes de iniciarem a viagem, mas só o receberam quando estavam a pouca distância de nossa cidade. E então, toda a fa ­ mília teve que enfrentar novamente a longa e penosa viagem de volta. Como fazia frio na época, bem se pode imaginar que provação à sua fé, foi para eles tòda aque­ la experiência. Senti tanto que resolví mandar-lhes pelo menos, o suficiente para cobrir as despesas da viagem. Mas, terminado o período de isolamento, descobri que não podia retirar os cinquenta dólares necessários com o nosso tesoureiro, porque o Sr. Goforth não estava em casa. Entretanto, o Senhor reconheceu aquela necessida­ de, muito antes de eu senti-la. Três dias depois que saí do isolamento, recebi uma carta do Sr. Horácio Goven, da Missão Fé, de Glasgow, enviando um cheque de cinco libras, que no câmbio da época, equivaliam a cinqiienta dólares americanos. A oferta vinha dos obreiros daquela missão escocesa, tendo o Sr. Horácio explicado que eu a devia receber como um presente pessoal. Nem ó pre­ ciso dizer que mandei o cheque no mesmo dia para os amigos, que dele necessitavam. Certa ocasião, quando estávamos temporariamente localizados em Wei Hwei, em Honan, fui chamada para tratar de um colega, missionário, que estava com varíola negra. Ele veio a falecer, e foi enquanto estava comple­ tamente isolada de todos por causa do contacto com a doença, que tive a seguinte experiência: Acordei uma noite, muito atribulada com a lem­ brança de alguém no Canadá. Tão forte era a impres­ são de que esta pessoa precisava de minhas orações, que

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me senti constrangida a levantar-me e passar um longo tempo, lutando com Deus em seu favor. Veio-me então a paz de espírito e pude dormir. Logo depois que saí do isolamento escrevi para esta pessoa, contando-lhe a experiência e indicando a data. Mais tarde, veio a resposta, dizendo que embora não pudesse dizer o dia certo, pois não fora anotado, ju l­ gava ter sido na época em que eu senti aquela ansiedade por orar que passou por um período de intensa tenta­ ção, que quase a dominou. Porém, dizia a carta: “ So­ breviví à crise e alcancei a vitória. Sei que foram suas orações, que me ajudaram” . O fato seguinte poderá parecer insignificante para alguns, mas, para mim nenhuma resposta trouxe maior alívio do que esta. Por isto eu o guardei para o final do registro original de orações. Meu esposo viajara a uma província distante, a fim de dirigir reuniões de avivamento. Enquanto ele esta­ va fora, fui com minhas evangelistas a um ponto de nosso campo, a pedido insistente dos cristãos da locali­ dade. Tratava-se de um movimento evangelístico inten­ sivo, durante quatro dias, ao qual acorreram multidões. Aqueles quatro dias dariam para cansar qualquer pes­ soa, por mais forte, que fôsse. Todos os dias, por muitas horas, enfrentamos aquelas turbas desordenadas, que iam e vinham. Terminada a nossa estada ali, fui para a casa, completamente exausta. Meu único pensamento era ir a Wei Hvvei, cidade próxima, onde havia traba­ lho de nossa missão, a fim de descansar uns dias, perto das crianças menores, que estudavam lá. Vê-las um

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pouquinho, eu bem sabia, seria o melhor remédio para refazer minhas energias. Mas, chegando a casa, não sei como, havia perdido a chave da gaveta do dinheiro. Era sexta-feira, e o trem para Wei Ifvvei saía às dez horas, no sábado. Uma e outra pessoa chegavam para buscar dinheiro, e eu tinha de dar alguma desculpa. Havia bastante dinhei­ ro na gaveta. Não podia sair, deixando a chave por ali. Além do que, eu não poderia viajar sem dinheiro. Logo depois do jantar, comecei a procurar a chave por toda parte. Rebusquei nas gavetas, nos comparti­ mentos da escrivaninha, nas estantes, tudo em vão. Depois de duas horaé de busca, e tão cansada que não pude mais continuar, pensei de repente: “ Eu não orei” . Parei ali onde me encontrava, ao lado da mesa da sala de jantar, e elevei o coração ao Senhor: “ Ó Deus, Tu sabes como preciso de descanso; Tu conheces meu de­ sejo de ver as crianças; compadece-Te de mim, e leva-me para onde está a chave” . E então, sem hesitar nem um só passo, atravessei a sala de jantar, o “ hall” , o quarto de hóspedes, e entrei no escritório do Sr. Goforth. Fui à biblioteca (que ocupava uma das paredes do cômodo), abri a porta, afastei dois livros, e lá estava a chave. O Senhor esteve tão perto de mim naquele momento, que quase senti Sua presença física. Não que eu me lembrasse de ter posto a chave ali, mas Éle me dirigira os passos àquele ponto. Sim, eu sei que Deus responde às orações.

IX AO SEU LOUVOR! Divulgarão a memória de Tua muita bondade. Escrevo este capítulo uns sete anòs mais tarde, para acrescentar ainda o meu testemunho de louvor. Voltamos ao Canadá na época da Primeira Guerra Mundial, e logo enfrentamos uma séria crise financeira. Só podíamos optar por um de dois caminhos. Ou apre­ sentaríamos nossas contas com tòda a franqueza à Junta de Missões, provando que nosso salário era insuficiente para fazer face às despesas, diante da alta de preços e condições de tempo de guerra; ou então, prosseguiria­ mos, arranjaríamos casa e o que fôsse preciso, e confia­ ríamos no Pai Celeste para prover-nos com o necessário acima da renda salarial. Resolvemos escolher este se­ gundo caminho. Minha querida filha ficou indignada com o fato de não termos um salário suficiente para nossas despe­ sas. Procuramos convencê-la de que confiar em Deus para o que faltava, não era pedir esmola. E chegou o dia em que esta filha entrou comigo pela primeira vez em uma nova casa. Ao entrarmos na sala de jantar, en­ contramos sóbre a mesa um grande volume de corres­ pondência, que viera da China para nós.

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Uma das cartas era de uma senhora da Austrália, cujas ofertas, no passado, sempre supriram alguma ne­ cessidade especial. Desta vez, enviava-nos cinquenta libras, com o desejo expresso de que trinta fossem em­ pregadas na obra da China, mas vinte libras fossem aceitas como presente a nós, pessoalmente. Passei a carta às mãos de minha filha, dizendo: “ Não devemos crer então que Deus cuidará de nós? Parece até que o Pai Celeste, aqui está junto de nós, a dizer: “ Filhinha, aceita estes cem dólares como garantia do que ainda vou fazer por t i” . Quando minha filha devolveu-me a carta, havia lá­ grimas em seus olhos, e ela me disse: “ Mamãe, nós precisávamos confiar em Deus, duas vézes mais!” Gostaria de escrever a história dos meses seguintes, mas seria um capítulo muito longo. O testemunho já escrito, basta. Foi neste mesmo período de licença que aprendi a ter uma visão maior de como Deus está pronto a aten­ der naquilo que para alguns, são as coisas mínimas da vida diária. Os missionários, e especialmente nós, que somos missionários, sabemos de sobejo como é que mui­ tos nos criticam pela maneira de vestir, seja em nossa terra ou seja quando estamos de viagem. Através dos anos, tenho passado por muitas experiências desta im tureza, umas engraçadas, outras até irritantes, que até resolvi fazer desta questão de vestuário, um assunto para oração. E alegremente testifico que o resultado desta resolução tem sido motivo de constante admiração e louvor. Sim, descobri que o Senhor podia guiar-me até mesmo a enfeitar o meu chapéu, para a Sua glória I

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Isto é, para que eu pudesse pôr-me de pé diante de um auditório e não desonrar meu Mestre. Louvado seja o Seu nome! Nada existe grande demais para o Seu poder, E nada existe pequeno demais para o Seu am or! Na época da Primeira Grande Guerra, um filho nosso foi para a Inglaterra com o primeiro contingente de forças canadenses. Quando esta notjcia chegou até nós lá na China, comecei a orar especialmente para que o Senhor usasse os talentos de meu filho da melhor maneira para o bem da pátria, mas que Üle o guardas­ se das trincheiras e da frente de combate. Meu filho não ficou sabendo desta oração. Algumas semanas depois de chegar à Inglaterra, aguardava ele ordens de partir para as trincheiras da França, quando chegou um aviso de que precisavam dele na sede do destacamento, e seu grupo saiu sem éle. Uns meses mais tarde, veio um chamado de voluntários, a fim de preencher as grandes brechas causadas pelo primeiro emprêgo de gás mortífero. Meu filho renun­ ciou à sua posição e entrou para uma companhia de vo­ luntários, que seria enviada à França. Pouco antes da partida, mandaram chamá-lo ao Quartel General, e lhe disseram que deveria ir à Base Canadense na França, como ajudante de ordens. Suas obrigações nesta desig­ nação o mantiveram na base de Despachos. Um ano mais tarde, traçou novos planos para demitir-se e che­ gar às trincheiras. Começou a tomar providências neste sentido, quando caiu do cavalo, acidente que o tornou

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inválido e o fez ser mandiulo de volta para o Canadá, onde o conservaram até o fim da guerra. Seria difícil convencer esta mãe, dc que tüdo acon­ teceu por acaso; porque houve um dia em que estava aflita, esperando a qualquer momento um cabograma, avisando que ele saira para as trincheiras, e recebí do Senhor a certeza de que Ele tinha o 'rapaz no Seu cuidado. Após nossa volta à China, estando muito atribula­ da, orei para que o Senhor me desse um sinal claro de Seu favor, concedendo-me certo pedido, com respeito a uma filha, que estava no Canadá. O pedido era um tanto complicado, incluindo muitos pormenores. Depois de um mês e pouco, recebi uma carta da filha por quem tinha orado ao Senhor. Escreveu toda contente, dizen­ do que recebera aquilo que eu pedi, e com todos os por­ menores, justamente conforme eu orei. Quando meu esposo deixou o trabalho regular do campo em Changte em Ilonan, foi necessário acharmos uma casa em outra parte. O único lugar adequado, que atendia às nossas necessidades ficava nas montanhas de Kikungshan, em Ilonan do S u l. Lá fomos procurar um terreno por mais de uma semana, e nada encontramos. Começamos então, a descer para o vale, logo depois da meia-noite. Eu sentia muito o nosso fracasso porque já havíamos entregue a casa, que ocupávamos. Quando meu esposo viu como eu estava triste, conforme contou mais tarde, começou a clamar fervorosamente para que o Senhor nos desse um terreno. Antes de chegar à es­ tação, veio-lhe a certeza de que sua oração seria respon­

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dida. Um amigo, que viajara no trem, na terceira elasse, viu-nos embarcando na segunda classe, e veio conversar conosco um pouquinho antes de chegar à sua estação. Quando soube que não tínhamos arranjado um lugar, disse: “ Sei de um terreno ótimo, que nossa missão está re-. Servando para uma futura casa de missionários. Vou pedir que seja dado aos senhores” . Bm poucos dias recebemos carta do tesoureiro da-. quela missão, dizendo que haviam votado unânime e alegremente para dar-nos a propriedade. Escrevo agora, estas palavras finais, aqui neste lar que Deus nos deu, construído neste belo local, um dos pontos mais lindos que há na China. E deste recanto tranqüilo, entre as montanhas, monumento ao que Deus pode dar-nos, em resposta à oração, envio meu livrinho de testemunhos de oração. Enquanto recordo o passado, e a admirável fidelida­ de de Deus, sinto pesar por não ter confiado mais no Senhor, e pedido mais — tanto para minha família como para os chineses. Sim, é na verdade, maravilhoso! Porém, a maravilha não está em que Deus possa atender a oração, mas no fato de que Ele atende, quando tão im­ perfeitamente satisfazemos às condições claramente as­ sentadas em Sua Palavra. Nestes últimos anos, sempre faço um exame introspectivo para sondar se estou satisfazendo a estas exi­ gências; quando se passam diversas semanas, e talvez meses, sem qualquer oração respondida, sinto que estou, em fraqueza espiritual.

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Como qualquer pessoa capaz de discernimento bem pode ver, todas as condições aqui mencionadas, estão in­ cluídas numa única palavra: Permanecer. CONDIÇÕES P A R A A ORAÇÃO PREVALECE

QUE

1. A humildade contrita perante Deus e a renúncia ao pecado — II Crônicas 7 :14. 2. Buscar a Deus, de todo o coração — Jeremias 29:12,13. 3. A fé em Deus — Marcos 11:23,24. 4. A obediência — I João 3:22. 5. Depender do Espírito Santo — Romanos 8 :26. 6. A importunação — Marcos 7 :24-30; Lucas 11 :5-10 7. Pedir segundo a vontade de Deus — I João 5:14 8. Em nome de Cristo — João 14:13, 14, e muitas outras passagens. 9 . É preciso estar disposto a corrigir males feitos a outras pessoas — Mateus 5 :23, 24. CAUSAS DO FR A C A SSO NA ORAÇÃO 1. O pecado no coração e na vida — Salmo 66:18; Isaías 59:1, 2. 2 . A recusa persistente em obedecer a Deus — Pro­ vérbios 1 :24-28; Zacarias 7 :1 1 ,13. 3. O formalismo e a hipocrisia — Isaías 1:2-15. 4 . A má vontade de perdoar outros - Marcos 1 1 :25-26 5. A motivação errada — Tiago 4:2, 3. 6 . O desprêzo à lei de Deus — Amós 2:4. 7 . Falta de amor e caridade — Provérbios 2 1 :13.

X A V IT Ó R IA ENCONTRADA Finalizando este pequeno volume, parece justo narrar mais uma vez uma experiência pessoal maravilhosa, publicada em The Sunday School Times, de 7 de dezembro de 1918 Não me lembro que em alguma época eu não tives­ se amor pelo Senhor Jesus Cristo como meu Salvador. Não tinha ainda doze anos completos quando em uma reunião de avivamento, aceitei a Cristo publicamente e o confessei como meu Senhor e Mestre. Desde então, cresceu em minha alma um desejo in­ tenso de conhecer Cristo de um modo mais real, pois, file me parecia tão irreal, tão distante e misterioso. Certa noite, quando eu ainda era bem jovem, lembrome de estar sob as árvores do jardim da casa de meus pais, a olhar o céu estrelado com um anelo intenso, dese­ jando sentir Cristo perto de mim. Ajoelhada ali na grama, sozinha com Deus, fêz-se minha a exclamação de Jó: “ A h ! se eu soubesse onde O podería achar!” Teria eu então, suportado saber que haveria de passar-se quase quarenta anos, antes de ter satisfeita aquela as­ piração? Com o desejo de conhecer a Cristo, de verdadeiramente “ achá-Lo” , surgiu em mim a paixão por Servi-Lo.

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Entretanto, que gênio terrível eu tinlia! Impetuosa, or­ gulhosa, cheia de vontades, cheia de qualidades, que eu sabia não serem as de Cristo. Passemos por cima dos anos de luta, que se segui­ ram, indiferente contra o eu pecaminoso até quase o quinto ano de nossa obra missionária na China. Sinto ter de dizer que a nova vida no país estrangeiro, com o clima penoso, os servos que me exasperavam, as condi­ ções totalmente irritantes, tudo isso parecia desenvol­ ver meu temperamento natural ao invés de subjugá-lo. Houve um dia (inesquecível para m im ). Estava eu sentada dentro de casa ao lado de uma janela de papel, à tardinha, e duas senhoras chinesas estavam sentadas do lado de fora. Puseram-se a conversar sôbre a minha pessoa, e eu (não devia, talvez), mas escutei. Disse uma delas: “ É sim, ela é trabalhadeira, uma pregadora zelosa, e nos ama realmente; mas, ai, que gênio forte ela tem ! Se ela vivesse mais como prega!” Seguiu-se uma descrição completa e fiel de minha vida e do meu caráter, tão fiel à verdade, que me tirou o jeito de ficar aborrecida e deixou-me humilhada até o pó. Enxerguei então, como era inútil, totalmente inú­ til, vir à China para pregar a Cristo e não viver Cristo. Mas, como poderia eu viver Cristo? Conhecia algumas pessoas (inclusive meu querido esposo), que possuíam paz e poder — sim, e algo mais que' não pude definir — que eu não possuía, mas muitas vezes, aspirei conhecer o segrêdo. Poderia uma natureza tal como a minha tornar-se paciente e moderada?

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Poderia eu deixar de preoeupar-me demais com tu d o ! Em uma palavra, haveria esperança para mim, para que eu pudesse viver Cristo assim como O pregavaí E u sabia que amava a C risto; muitas e muitas ve­ zes provei que era capaz de abandonar tudo p or Sua causa. Mas, era forçada a reconhecer também que, bas­ tava eu perder a calma com os chineses ou com meus filhos, diante dos chineses, uma vez e, em grande parte teria desfeito semanas e quem sabe meses, de serviço sacrificial. Nos anos que se seguiram, muitas vezes fui como que conduzida através de uma fornalha ardente. O Senhor sabia que só o fog o poderia p u rifica r as im pu­ rezas do meu ego recalcitrante e reeducá-lo. Quero re­ sumir aqueles anos em uma só fra s e : “ Lutei, segui, guardei, p elejei” . Sim, e muitas vezes, falh ei! Outras, desesperava-me com a derrota, mas depois prosseguia, resolvida a fazer o meu melhor — um melhor muito lim itad o! No ano de 1905, e após, observando o modo admi­ rável como o Senhor dirigia meu esposo; vendo o poder do E spírito Santo em sua vida e mensagem, cheguei a buscar muito especialmente a plenitude do Espírito para mim mesma. F oi uma época de profu n d o exame do meu próprio coração. Foi-m e revelado como nunca antes, a negridão do pecado. Havia muito o de que eu precisava endireitar com os homens e com Deus. A pren ­ dí o que significava “ p aga r o preço” . Foram dias de maravilhosas experiências de enlêvo espiritual, em que aprendí a honrar o E spírito Santo e buscar o Seu poder

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para vencer o pecado de uma forma nova, para mim. Porém, Cristo continuava, como antes, distante, longe, e eu desejava tão ardorosamente conhecer — encontrar o Mestre. Embora eu sentisse mais poder sobre os pe­ cados habituais, havia horas de grande escuridão e der­ rota. Foi numa hora difícil como essas, que nos vimos forçados a voltar ao Canadá, em junho de 1916. A saú­ de de meu marido não lhe permitia falar em público. Parecia-me que esta obrigação de ambos, haveria de recair sobre mim. E eu temia muito enfrentar a igreja ali em minha pátria, sem uma inspiração maior — sem uma nova visão. O Senhor viu esta fome do meu coração, e gloriosamente cumpriu a Seu modo, a promessa: “ Dessedentou a alma sequiosa, e fartou de bens a alma fa ­ minta” . (Salmo 107:9). Deveria realizar-se um retiro espiritual, em Niágara-do-Lago, Ontário, em fins de junho. Deus dirigiume para lá. Certo dia, fui à reunião, um pouco a eontragôsto, pois, tudo era tão lindo ali sob as árvores, à margem do lago. O pregador era um desconhecido, mas desde o princípio, sua mensagem apoderou-se de mim — A Vitória sôbre o Pecado! Ora, não era por isto que eu lutara e ansiara por tôda a minha vida? E era isso possível ? O orador foi descrevendo de modo bastante simples a experiência comum da vida cristã: às- vezes, ela atinge pontos altos, com a visão de D eus; após, vêm o declínio, o afastamento da visão, a frieza, o desânimo, talvez até a desobediência, com um período de experiência descen-

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dente. Aí, quem sabe, uma aflição, ou mesmo algum fa­ vor especial traz o viandante de volta a seu Senhor. O pregador convidou todos aqueles que sentiam ser êste um retrato de sua própria experiência, a levantar a mão. Estava eu na primeira fila, pelo que fiquei com vergonha de levantar a mão, imediatamente. Mas, eu queria tanto receber tudo o que Deus tinha para darme, que resolvi ser sincera, e após uma luta interior, le­ vantei a mão. Pensei que haveria outros como eu, por­ tanto, aventurei dar uma olhadela para trás. Vi que muitas eram as mãos erguidas, embora o auditório fôsse quase todo constituído de obreiros cristãos, ministros e missionários. O dirigente prosseguiu, dizendo que esta vida, que acabava de descrever, não era a que Deus planejou ou desejava para os Seus filhos. Descreveu a vida no plano mais elevado, de paz, tranqiiilidade no Senhor, poder e libertação da luta, das preocupações e dos cuidados. Ou­ vindo, custou-me crer que fôsse verdade; entretanto, tôda a minha alma comoveu-se de tal forma que só com muita dificuldade pude conter a emoção. Vi nesse ins­ tante, embora indistintamente, que eu me aproximava do alvo, que mirei toda a minha vida. Na manhã seguinte, ao raiar do dia, pus-me de joelhos a examinar com atenção e oração todas as pas­ sagens sobre a vida vitoriosa contidas num folheto. Era motivo de consolo e fortaleza, ver que na Bíblia, a vitória e não a derrota, caracterizava vontade de Deus para Seus filhos, e que Ele tudo provê, de forma ma­ ravilhosa ! Mais tarde, durante aqueles dias ali, recebi

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mais luz. F iz o que foi pedido — em silêncio, porém, de modo definido, aceitei a Cristo como meu Salvador do poder do pecado assim como há tanto tempo, eu O aceitara como meu Salvador do castigo do pecado. E descansei sobre esta verdade. Saí de Niágara, sentindo contudo, que ainda havia algo, que eu não possuía. Sentia-me como o cego, quan­ do disse: “ V ejo os homens, porque como árvores os vejo, andando” . Começava a ver a luz, mas, vagamente. Chegando a casa, no outro dia, apanhei um livrinho chamado A Vida Vitoriosa ( The L ife That W ins), que ainda não tinha lido, antes, fui para junto do leito de ineu filho e lhe disse que era o testemunho pessoal de um homem, do qual Deus utilizou-se para trazer grande benção à minha vida. Li-o em voz alta até chegar às palavras: “ Por fim reconhecí que Jesus Cristo estava real e totalmente dentro de mim” . Parei maravilhada. Saiu o sol de trás de uma nuvem, inun­ dando de luz toda a minha alma. Como havia eu sido cega! Percebi enfim, o segredo da vitória — o próprio Senhor Jesus Cristo — Sua vida vivida no crente. Con­ tudo, a idéia de vitória perdeu-se por um momento no gôzo indizível de conhecer a presença viva do Cristo, que habita em nós! Como um viajor cansado, e abati­ do, que finalmente encontra o lar, eu descansei e apoieime hEle. Firmei-me em seu amor — em Sua Pessoa. E então, ó gôzo, minha vida inundou-se de paz e alegria! Uma quietude e tranqüilidade de espírito, que jamais pensei sentir, apoderaram-se de mim com naturalidade. IJma nova vida começou em mim, ou melhor, para mim. Era justamente “ a Vida, que é Cristo” .

EU SEI QUE DEUS RESPONDE AS ORAÇÕES

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0 primeiro passo dado nesta nova vida foi assen­ tar como base a Palavra de Deus, e não o mero ensino do homem ou mesmo a experiência pessoal. Meditei es­ pecialmente sobre a verdade da presença de Deus em nós, a vitória sobre o pecado e as provisões abundantes da graça de Deus. A Palavra fêz-se clara com nova luz para mim. Os anos que se vão passando têm sido anos de abençoada comunhão com Cristo, e de alegria no Seu serviço. Há pouco tempo, um amigo indagou-me se po­ dería eu exprimir numa palavra, o resultado para minha vida, daquela experiência vivida em 1916, ao que lhe respondí: “ Sim, tudo pode resumir-se numa só pala­ vra : Confiança. ” Perguntam-me alguns: “ Mas, a senhora não pecou mais?” Sinto dizer que pequei. O pecado é a única coisa a que tenho horror — porque o pecado, se não houver arrependimento, pode separar-nos não só de Cristo como também da consciência de Sua presença. Entretanto, eu aprendi que há sempre perdão e restau­ ração instantânea, ao nosso alcance. Não é preciso haver ocasiões de desespêro. Um dos resultados benditos desta nova vida é não só o de sentir a presença de Cristo, mas o de conhecer a realidade de Sua presença, manifesta em outros re­ sultados específicos, quando nas mínimas coisas da vida de cada dia, deixamos qualquer assunto com Ele para que Ele o resolva. Expresso meu pensamento neste sentido, com as belas palavras de Spurgeon:

ROSALIND GOFORTH

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“0 0 0 0 0 0 0

que que que que que que que

a mão é para a harpa, o sôpro é para a flauta, a mãe é para o infante, é o guia ao viajante, é o óleo à onda em fúria, o resgate é para o escravo, a flor ç para o inseto, Jesus Cristo é para mim.

Transcrevo aqui o estudo bíblico, que fiz naquela ocasião: A

PRESENÇA

DE

DEUS

0 segredo da vitória é simplesmente o próprio Cristo no coração do crente. Esta realidade da presen­ ça interior de Cristo é, e sempre foi, um mistério. Romanos 16:25 Efésios 3:9 e Colossenses 1:26, 27 Efésios 5 :30, 32 Colossenses 4 :3. Cristo Mesmo, ensinou esta verdade. João 14 :20, 23; 15 :l-7 ; 1 7 :21-23 Mateus 28 :20 Apocalipse 3:20. (Ver também, 16:20).

Marcos

Foi uma realidade vital para o Apóstolo Paulo. Romanos 8:10 I Coríntios 6:15 I Coríntios 12:27 II Coríntios 5:17 II Coríntios 1 3 :5

EU SEI QUE DEUS RESPONDE AS ORAÇOES

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Gálatas 2:20 Gálatas 3:27 Gálatas 4:19 Efésios 3 :17 Filipenses 1 :21 I Tessalonicenses 5 :10 Hebreus 3 :6 . As palavras, em Cristo, repetidas em muitas outras passagens, ganharão novo sentido quando lidas à luz do que vai acima. O Apóstolo João tinha igual conceito da presença interior de Cristo. I João 2 :28 — 3 :6, 24 I João 4:4, 12, 13, 16 I João 5:20. 0 PROPÓSITO DE DEUS Como a vitória é o resultado da vida de Cristo, vi­ vida pelo crente, é importante vermos claramente que a vitória e não o fracasso é o propósito de Deus para os Seus filhos. As Escrituras são positivas neste sentido. Lucas 1 :74, 75 Romanos 5 :2 Romanos 6 e 8 (Romanos 7 deve ser lido à luz de Romanos 6 e 8 ). 1 Coríntios 15:57 II Coríntios 2 :14 II Coríntios 10:4-5 Efésios 1 :3, 4 Colossenses 4:12

ROSALIND OOFORTH

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I Tessalonieenses 5 :23 II Tessalonieenses 3 :3 II Timóteo 2 :19 Tito 2 :12 Hebreus 7 :25 I Pedro 1 :15 II Pedro 3 :14 I João 2 :1 I João 3 :6, 9. E muitas outras passagens. O fato de que Cristo veio como Salvador do poder bem como da penalidade do pecado, vemos em Mateus 1:21, com João 8:34, 36 e Tito 2:14. A

PROVISÃO

DE

DEUS

Deus reconhecia a fragilidade do homem, que este era no seu coração, “ desesperadamente corrupto” , que mesmo sua retidão era “ como trapo de imundícia” , que a única esperança de vitória sobre o pecado deveria vir da parte de Deus. E Ele portanto, fêz provisão tão rica, tão suficiente, tão sobremaneira abundante, que ao pensar sobre ela, sentimos ter descoberto uma mina de riqueza profunda demais para ser avaliada. Sugere esta riqueza: A maior provisão de Deus é a dádiva de uma parte de Seu próprio Ser, na Pessoa do Espírito Santo. A seguir tômos algumas das muitas coisas, que o Espírito Santo faz para nós, conforme estãò registradas na Pa­ lavra : Ele nos gera para entrada na família de Deus João 3 :6

EU SEI QUE DEUS RESPONDE AS ORAÇÕES

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Ele nos sela ou marca como sendo de Deus Efésios 1:13 Ele habita em nós — I Coríntios 3 :16 Ele nos une com Cristo — I Coríntios 12:13, 27 Ele nos transforma -à semelhança de Cristo II Coríntios 3:18 Ele nos ajuda na oração — Romanos 8 :26 Ele consola — João 14:26 Ele guia — Romanos 8 :14 Ele fortalece-nos com poder — Efésios 3 :16 Ele é a fonte de poder e de frutos João 7 :38, 39. Alguns dos resultados vitoriosos em nossa vida, à medida que Cristo domina em nós aparecem em: Romanos 8:32, 37 Romanos 15:13 II Coríntios 9:8, 11 II Coríntios 2:14 Efésios 1 :19 Efésios 3 :16, 20 Filipenses 4:7, 13, 19 Colossenses 1:11 I Pedro 1:5 II Timóteo 4:17 Judas 24 João 15:7. Para quem busca maior direção das Escrituras, su­ giro um plano, que trouxe grande benção para mim. Ler todos os Salmos, tomando nota cuidadosamen­ te de todas as afirmações sobre o que o Senhor era para os escritores dos Salmos. A lista causar-lhe-á admira­

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ROSALIND GOFORTH

ção. E então, de joelhos, considere-as uma por uma, orando para que Cristo seja para você o que Èle foi para Davi e os demais. Consultando uma Concordância Bíblica, procure os textos registrados sob os títulos: Amor, Plenitude, Po­ der, Riquezas, Graça, etc., agrupando-os em estudos bí­ blicos utilizáveis. Por exemplo, com a palavra Graça — quanto mais a estudamos, mais maravilhosa se torna. Eis aqui alguns dos títulos: Graça sobre graça — João 1 -.16 Graça suficiente — II Coríntios 12:9 Maior graça — Tiago 4 :6 Toda graça — II Coríntios 9 :8 Graça abundante — Romanos 5:17 Graça transbordante — I Timóteo 1 :14 A suprema riqueza da Sua graça — Efésios 2 :7 . Porém, é preciso lembrar que apenas conhecer ri­ quezas nunca traz benefício importante. Devemos tor­ ná-las nossas. Toda a plenitude habita em Cristo. So­ mente à medida que nós apreendemos (entendemos) Cristo através do Espírito Santo podemos fazer nossas estas riquezas espirituais. O lema desta vida gloriosa em Cristo é apenas este: “ Confiar e deixar Deus agir” .
Rosalind Goforth - EU SEI QUE DEUS RESPONDE ÀS ORAÇÕES

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